Por Gleason L. Archer
Por que não temos em mãos agora algumas cópias fiéis dos originais infalíveis? Porque a produção de uma cópia perfeita, até mesmo de um único livro, está tão longe da capacidade de um escriba humano que se torna necessário o Senhor Deus realizar um milagre para que se produza tal cópia. Ninguém pode esperar que o mais cuidadoso dos copistas seja capaz de reunir infalibilidade técnica para transcrever um documento original e assim produzir uma cópia idêntica. Não importa quão preocupado esteja com pingar todos os is, com cortar todos os tês e com evitar confusão entre parônimos, homônimos, homógrafos e homófonos (como "vultoso" e "vultuoso", "Saul" e "Saulo", "conhecer" [saber] e "conhecer" [copular], "laço" e "lasso"), acabará cometendo um deslize, ainda que involuntário. É por essa razão que os escritores precisam verificar tudo quanto escreveram e os editores devem empregar revisores e leitores de provas qualificados. No entanto, até os mais atentos desses profissionais por vezes deixam passar erros. Foi o caso da "Bíblia imoral", do século XVI, que foi para a imprensa com o sétimo mandamento alterado: "Adulterarás". Embora essa edição fosse imediatamente recolhida, o erro chegou ao conhecimento do povo, para enorme embaraço do editor. Tais enganos acontecem de tempos em tempos, simplesmente por causa da atenção imperfeita de qualquer ser humano. Nada senão a intervenção divina pode impedir o erro e garantir uma cópia inteiramente isenta de engano, neutralizando a propensão humana para o deslize na pontuação ou na grafia. Permanece, porém, o fato importante de que a comunicação perfeita é possível, a despeito dos erros técnicos de um original.
A verdadeira questão diz respeito a erros de um copista: um eventual acúmulo de deslizes resultaria em obscuridade ou na perversão da mensagem que se pretendeu passar originalmente? Críticos textuais bem treinados, trabalhando com base em metodologia sadia, são capazes de retificar praticamente qualquer má informação resultante de um erro em qualquer manuscrito. Entretanto, no caso de documentos em que o ato de copiar foi realizado com a intenção deliberada de alterá-los ou com o desejo pessoal do copista de pervertê-los, é bem possível que a mensagem original fique alterada para sempre, sem que se possa recuperar. A questão que se relaciona ao texto da Bíblia concentra-se nos dados da crítica textual. Existiria alguma prova objetiva da parte dos manuscritos das Escrituras de que os 66 livros nos foram transmitidos num grau de exatidão que nos garanta terem sido as informações contidas nos originais preservadas com perfeição? A resposta é um SIM bem grande.
Contrastando com a maior parte de outros documentos antigos que sobreviveram em múltiplas cópias (tais como o Conto de Sinuhe, egípcio, ou a "pedra de Behistun", inscrição trilíngüe de Dario I), a verificação cuidadosa de muitas centenas de cópias manuscritas do século III a.C. até o século VI d.C. apresenta uma quantidade espantosamente limitada de variações na redação. Na verdade, os melhores especialistas da crítica textual reconhecem desde tempos antigos que, havendo qualquer variante que seja comprovada de modo aceitável e tomada do aparato no rodapé da página, a fim de substituir o texto aceito do manuscrito-padrão original, isso de modo algum indica alterações significativas na doutrina ou na mensagem. Essas poucas variações só podem ser explicadas como o resultado de medidas especiais de controle, as quais seriam exercidas por Deus, o inspirador dos manuscritos originais, tendo ele assegurado a sua preservação, para benefício de seu povo. Um grau de desvio tão sério que alterasse o sentido redundaria na impossibilidade de se atingir os propósitos da revelação divina original: que os homens tivessem certeza da santidade e da graça de Deus e pudessem conhecer sua vontade para eles, a salvação.
Os leitores porventura interessados em pesquisar mais ainda a questão da crítica textual do AT ou desejosos de maiores informações a respeito das antigas cópias das Sagradas Escrituras descobertas nas grutas de Qumran, nas proximidades do mar Morto, deverão consultar a obra de Ernest Würthwein, *The text of the Old Testament* (Oxford, Basil Blackwell, 1957) ou minha obra *Merece confiança o Antigo Testamento?* (4.ed., São Paulo, Vida Nova, 1996, caps. 3 e 4). Quanto ao texto do Novo Testamento, consulte-se *An introduction to the textual criticism of the New Testament,* de A. T. Robertson (2.ed., New York, Doubleday, 1928) ou *The text of the New Testament,* de Vincent Taylor (London, Macmillan, 1961).
Archer, Gleason L. *Enciclopédia de Temas Bíblicos: respostas às principais dúvidas, dificuldades e “contradições” da Bíblia.* Tradução Oswaldo Ramos. 2. Ed. São Paulo: Editora Vida, 2001, pp. 26-27.
Via Walson Sales.
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