Estamos sempre a alguns minutos da eternidade, mas nunca sabemos quando chegará a hora de findar a nossa existência nesta terra. Não temos o controle da vida e nem do tempo “Vocês não sabem como será a sua vida amanhã, pois vocês são como uma neblina passageira, que aparece por algum tempo e logo depois desaparece.” (Tg 4.14). A falta de percepção da finidade do tempo e da efêmera vida faz com que muitos desperdicem o aproveitamento do tempo e tornem a vida desprovida de propósito e da importância que ela significa. Todas as coisas são feitas no tempo, e todas as coisas que são bem aproveitadas não são perdidas, a humanidade vive a existência como se tivesse muito tempo para aproveitar, mas o tempo passa velozmente e a nossa existência também.
Dedicarei esse texto a uma pessoa muito humilde que conheci. Ela merece pelo menos ser lembrada por aqui.
Lá vem ela, magrinha, rosto enrugado, cabelos grisalhos e despenteados, porém sorridente e até contente, nem parecia que sofria, sempre ao chegar perto dizia:
- Irmãozinho, como vai? O senhor pode me dar dois reais?
- Sim querida, posso sim, era sempre assim.
Como sempre, eu já estava costumado a vê-la no mínimo duas ou três vezes por semana. Sempre quando podia, lhe ajudava com alguma coisa dentro das minhas possibilidades naquilo que era necessário, meu intuito era ajudá-la a suprir suas necessidades, mas como sempre, não era o suficiente. Algumas vezes cheguei a doar roupas usadas, que tinham sido minhas e de minha esposa, também colhi roupas de outras pessoas para ela. Fiz um laço de amizade muito forte com ela, mas meu diálogo com ela não durava muito, era rápido, pois eu não dispunha de muito tempo. Na verdade, eu nunca sequer lhe perguntei o seu nome e até hoje eu não sei o nome dela, mas confesso que me emocionava todas as vezes que ela me chamava de irmãozinho, ela lembrava a minha mãe, na verdade ela possuía traços bem parecidos.
Sempre quando ela aparecia, eu não tinha tempo para quase nada, estava sempre ocupado, eu trabalhava em dois empregos em cidades diferentes, o corre-corre era muito grande, por isso as nossas conversas não se estendiam por um longo tempo, mas mesmo assim, ela sempre se despedia com um sorriso no rosto. Passaram alguns dias e eu comecei a sentir falta dela, depois de semanas sem ela aparecer, percebi que ela havia desaparecido, e já fazia um bom tempo. Eu não tinha um número dela ou uma conexão com a internet que me levasse até ela, na verdade ela nem sequer tinha telefone, nem endereço, quanto mais internet. A ausência dela me preocupava, eu pensava comigo, onde está aquela que mim chama carinhosamente de irmãozinho, já faz muito tempo que ela não aparece, já estou com saudades. Dias depois, de repente um senhor maltrapilho que a conhecia veio até o meu trabalho e me disse:
- A véia (velha) estar muito doente.
- O que? Onde? Perguntei!
- No hospital público da cidade, disse ele.
- Mas, faz quanto tempo? Perguntei!
- Já fazem quase três meses disse ele.
- Certo! vou visita-la respondi para ele, com a voz já meio embargada.
Só agora entendi o porquê do seu desaparecimento, ela estava doente. Na segunda feira, fui até a igreja que congrego e pedi oração por ela, falei que na terça feira eu iria visita-la, mas chegou a terça feira e eu não fui, chegaram a quarta, a quinta, a sexta e o sábado e eu não fui. Como sempre eu estava ocupado sempre, sem tempo para nada, a falta de tempo era a minha desculpa para tudo, eu sabia que dava para separar pelo menos alguns minutos, mas não separei, infelizmente.
No sábado eu dissera a mim mesmo, na segunda feira, depois de amanhã eu passo lá, é caminho de casa, não tem como não passar. E isso foi num sábado. No domingo de manhã minha esposa me avisara que a comida dos gatos havia acabado e prontamente fui ao supermercado logo cedo comprar a ração deles, na volta passei por uma rua que ficava na esquina do hospital onde ela se encontrava internada, ao chegar bem perto o meu coração acelerou, bateu forte e estremeceu, as lágrimas começaram a cair e a banhar o meu rosto e eu entrei em desespero. Não! Eu não acredito que isso aconteceu, fiquei chocado. Havia um carro da funerária parado na porta do hospital, logo pensei, foi ela quem partiu! aquela que sempre me visitava e me chamava de irmãozinho, aquela que eu nem sequer sei o seu nome.
Parei o carro e perguntei para mim mesmo: como foi que eu deixei isso acontecer? sem sequer me despedir dela, como pude não fazer sequer uma visita a ela? como não tive tempo de falar do amor de Cristo para ela? Como fui tão insensível, tão ocupado, tão acomodado. Como não fui capaz de reservar alguns minutos para lhe fazer uma visita, ela estava tão pertinho e eu tão distante, como eu fui capaz, como? E o que mais me doeu foi ver o tipo de caixão que funerária havia trazido, era daquele do tipo doado pela prefeitura, muito fraco. Naquele momento já era tarde demais, não havia nada mais a fazer. Sinceramente, não sei como foi seu velório ou enterro, nem sei se ela teve um enterro digno com cortejo e tudo, ou se simplesmente fora levada direto para o cemitério.
Não sei onde fica o seu túmulo no cemitério da cidade, também nem sei se ela tem um. Talvez se algo tivesse de ser inscrito na lápide de seu túmulo, esse algo seria: Aqui jaz “Fulana de Tal”, amou e quase não foi amada, tentou agradar e quase não agradou, morreu como viveu, sozinha.
Sabe, ainda hoje eu choro. Foi difícil para mim escrever esse texto. Soube depois que no hospital ela havia se entregado para Cristo e isso amenizou a minha dor. Pessoas como ela estão todos os dias a nossa volta, ao nosso redor, vem e vão embora sem sequer serem notadas, passam despercebidas sem nenhum pingo da nossa atenção. Será que vale apenas nos apegarmos tanto as coisas efêmeras desse mundo e esquecermos de coisas tão valiosas e importantes que estão bem pertinho de nós como nosso próximo? Será que vale apenas negar um sorriso ou um abraço por causa do corre, corre desta vida, por causa da importância dos negócios e dos bens materiais? Pare e pense um pouco, viva para Deus, viva para você, viva para as pessoas que estão ao teu redor. Sinta a dor do aflito, abrace o necessitado, estenda a mão ao infeliz, sacie a sede do sedento e alimente o faminto. Afinal de contas ninguém é melhor do que ninguém, somos todos iguais e a vida passa rápido demais. O que foi que trouxemos para o mundo? Nada! E o que é que vamos levar do mundo? Nada! (1 Tm 6.7) Aproveite a vida, habilite-se a viver da forma que a Palavra de Deus ensina. Lembre-se: a vida passa rápido demais. Vitor Hugo disse certa vez: “A vida já é curta, mas nós tornamo-la ainda mais curta, desperdiçando tempo.”
No que diz respeito a transitoriedade da vida, a Bíblia Sagrada fala muito melhor do que as minhas palavras. Veja logo a seguir algumas comparações lindas e poéticas, profundamente solenes sobre a transitoriedade da vida.
É uma peregrinação (Gn 47.9)
É água que se derrama (2 Sm 23.16,17)
É uma lançadeira no tear (Jó 7.9)
É um sopro (Jó 7.7)
É vaidade (Jó 7.16)
É uma sombra (Jó 8.9; 14.14; Sl 102.11)
É um correio (Jó 9.25)
É um navio veleiro (Jó 9.25)
É como uma águia (Jó 9.26)
É um palmo, um nada (Sl 39.5)
É como um sonho (Sl 73.20)
É como um conto que se conta (Sl 90.9)
É como uma erva que vai secando (Sl 102.11; 1 Pe 1.24,25)
É como um vapor (Tg 4.14)
Por Nivaldo Gomes.
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