Na Bíblia Sagrada, nem nos livros considerados apócrifos pelo protestantismo nem na tradição cristã da igreja primitiva, não há referência ao modo de como o catolicismo romano se refere à Maria, somente a partir do século IV. Já nos evangelhos considerados canônicos pela Igreja Católica, pouco se fala sobre Maria, a mãe de Jesus. Não mencionam sua genealogia nem como ela viveu antes de receber a promessa de Deus de que conceberia o Senhor Jesus de modo milagroso; nem de como conheceu José e como viveu após a morte cruel de seu Filho Jesus Cristo. Até porque, nas Sagradas Escrituras, a ênfase dada é a Jesus Cristo. Só por volta do século IV, após a morte de Constantino, foi que alguns teólogos começaram a ventilar algumas teorias acerca de Maria. No entanto, alguns escritos até de homens considerados Pais da Igreja revelam o que pensavam a respeito de Maria. Mais tarde, seus pensamentos se tornariam dogma da Igreja Católica Apostólica Romana. A maioria desses escritos são baseados em revelações feitas através da fé. Por esta definição, Afonso diz que “Tais revelações feitas por Deus mesmo, ou por meio de anjos e santos, são possíveis, são reais e sempre existiram na Igreja”. Ele diz ainda que “As revelações privadas não pertencem ao depósito da fé, de cuja conservação, explicação, pregação se acha encarregada a Igreja Católica” (LIGÓRIO, 2016, pp. 15,16). Fica evidente que os teólogos da Igreja Romana blindaram qualquer crítica feita às revelações e posteriormente dos dogmas acerca de Maria. No entanto, como dissemos anteriormente, não existe nenhuma base bíblica para as definições que o catolicismo atribui a Maria, quer seja pelos seus títulos ou pelos seus atributos. Tudo é mais uma questão de fé nas revelações, nas tradições e nos dogmas da Igreja Católica Romana.
A Virgem Maria é considerada pela Igreja Católica como sendo a primeira cristã e a primeira mártir da fé em Cristo, mesmo antes de receber a promessa de que conceberia o Cristo. Santo Afonso afirma: “Desde o primeiro momento em que esta celeste menina foi santificada no seio de sua Mãe (que foi o primeiro instante de sua Imaculada Conceição), recebeu também o uso perfeito da razão” (2016. p. 273). Ou seja, no momento em que a mãe de Maria a concebeu, ela já estava santificada e preparada para tal serviço, com total conhecimento de sua árdua tarefa. Ainda podemos observar que não é só prestada a honra ou veneração a Maria, mas os romanistas a glorificam como uma deusa, colocando-a, em determinados momentos, como superior a Cristo, atribuindo-lhe, entre outros, o papel de mediadora. Vejamos:
Além de associar Maria com Cristo na aquisição do tesouro da Redenção, a Igreja a coloca ao seu lado na distribuição desse tesouro. Ela é mediadora das graças da salvação do mesmo modo que Cristo. Sem dúvida, Cristo é o mediador principal porque só Ele o é com méritos divinos, mas Maria, embora só tendo méritos de côngruo, como humana que é, ajunta a eles o direito de ser Mãe do Salvador de modo que a sua mediação oferece toda a garantia de atendimento (MIEGGE, 1962, pp. 9,10).
De acordo com o testemunho do catolicismo, Maria foi demasiadamente obediente, sacrificando toda a sua vida. Aliás, mesmo antes Deus a tinha escolhido, dando-lhe a Imaculada Conceição, ou seja, nascida sem pecados, já que Jesus não tem pecado. Portanto, Maria, como mãe do Salvador, também não poderia ter pecados, por isso teria que ser poupada da maldição que, segundo a Bíblia, atingiu toda a humanidade, conforme Romanos 3.23 e 5.19. Por ser recente, essa doutrina sofre muitas críticas por parte dos teólogos protestantes e estudantes da Bíblia, pois, como doutrina, entende-se que a mesma deveria ter a mesma idade da fundação do cristianismo ou até mesmo traços relatados no Antigo Testamento.
No entanto, essa doutrina trata de fé e prática da Igreja Romana mais recente e não existe nenhum vestígio dela ao menos nos três primeiros séculos da era cristã. Pelo contrário, observamos que a prática da idolatria foi veementemente condenada tanto na Lei, que compreende o Antigo Testamento, quanto na dispensação da Graça, que compreende o Novo Testamento (Êx 20.3-5; Mt 22.37).
Esse dogma de fé passou a ter validade como doutrina reconhecida no romanismo e pregada abertamente pelos seus adeptos e líderes a partir de 8 de dezembro de 1854, através da Bula papal “Ineffabilis”, por Pio IX. Ela recebeu um forte adversário na Idade Média. Um dos maiores teólogos do catolicismo, Agostinho de Hipona, disse: “O corpo de Maria foi formado por geração ordinária. Maria morreu por causa do pecado de Adão, pois que ela também era filha” (apud SANTOS, 2017, p. 76). E ainda Thomás de Aquino: “A respeito dessa autoridade, afirmou que, ‘os Papas Bento XV e Pio XI, disseram que a sua doutrina é a própria doutrina da Igreja’. Thomás de Aquino ainda diz que, se a alma de Maria não estivesse sujeita ao pecado original, isso derrotaria a dignidade de Cristo [...]” (Encíclica Fausto Epetente Die, de 29 de junho de 1921, p. 10 Apud SANTOS, 2017, p. 76).
Ainda podemos citar a Bíblia, pois, não tendo Maria pecado, não necessitaria de Salvador. Entretanto vemos que ela mesma fala no evangelho de Lucas 1.46,47: “Disse, então Maria: A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador”. Portanto, entendemos que, se essas fortes críticas fossem nos dias atuais, muito provavelmente os teólogos e cristãos que não aceitam esse ensinamento seriam excomungados do meio da Igreja Católica Apostólica Romana, não podendo mais participar da comunhão, e, talvez pudessem ser até mortos e acusados de heréticos.
Maria ainda recebe outros títulos extrabíblicos no catolicismo romano, como de Rainha dos céus, Rainha dos santos, Rainha dos patriarcas, Rainha dos profetas, Rainha dos mártires entre tantos outros. Segundo o testemunho católico de Clodovis, “Os títulos de realeza de Maria têm base teológica firme, seja ela bíblica, litúrgica ou patrística” (2006, p.161). Ligório a define como Rainha de Misericórdia, pois, para ele, Maria, como sendo “cheia de doçura e clemência, sempre inclinada a favorecer e fazer bem a nós, pobres pecadores. Quer por isso a Igreja que saudemos nesta oração com o nome de Rainha de Misericórdia” (2016. p. 36). Esses títulos e definições são segundo a tradição da Igreja Católica Apostólica Romana. Suas doutrinas a exaltam sobremaneira que a colocam como participante da trindade, formando, assim, um quarteto divino, com Maria sendo correlacionada com as três pessoas da mesma essência, ou seja, a trindade: o Pai, que é Deus, o Filho, que é Jesus, e o Espírito Santo. Sendo Maria Filha de Deus, como criatura e protegida, Mãe de Jesus, preservada do pecado original e assunta aos céus, intercede pelos que creem e clamam por ela. Por fim, ela é Esposa do Espírito Santo, gerando Jesus através da obra Dele e, de certa forma, assumindo o papel Dele na vida dos romanistas, formando, assim, a família divina para o romanismo. Vejamos:
O que o romanismo fez de Maria, mãe humana de nosso Senhor e Redentor Jesus Cristo, jamais seria escrito por todos os profetas e apóstolos, caso lhes fosse relatado antecipadamente que viria um dia que isso seria praticado pela igreja que nosso Senhor fundou com tanta solidez. Ela recebeu dessa igreja (católica romana) toda a atribuição que até então unicamente Deus recebia. É possuidora de todos os atributos divinos. [...]. Há uma estampa de Trindade em que Maria aparece como a quarta pessoa da deidade, pairando acima do Pai, do Filho e do Espírito Santo (COLLETTE, 2001, p. 10).
Maria é confessada pelos católicos no quadro de mulheres libertadoras do povo, porém com o destaque de ser a maior delas por ser geradora do Messias-Rei, tornando-se a Rainha-Mãe e participante diretamente da função soteriológica e libertadora do Filho.
Por Rafael Félix.
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