segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

A DESTRUIÇÃO DE JERUSALÉM E A DIÁSPORA

“...Quanto a estas coisas que vedes, dias virão em que não se deixará pedra sobre pedra, que não seja derrubada.  Quando virdes Jerusalém cercada de exércitos, sabereis que é chegada a sua desolação. Então os que estiverem na Judéia, fujam para os montes, os que estiverem no meio da cidade, saiam, e os que estiverem nos campos, não entrem nela. Pois dias de vingança são estes... Cairão ao fio da espada, e para todas as nações serão levados cativos.  Jerusalém será pisada pelos gentios, até que os tempos deles se completem.” Lc 21.5,6,20-24; Mt 24.1,2,15-22; Mc 13.1,2,14 20.

Não foi apenas no Sermão Profético que Jesus se referiu à destruição de Jerusalém.  Em sua entrada triunfal, o Senhor profetizou sobre o fim trágico da cidade (Lc 19.41-44), o que ocorreu poucas décadas após.  É importante observar que esta profecia não fazia sentido na época em que foi proferida, principalmente no que se refere à destruição do templo. Por que seria destruída uma maravilha arquitetônica reconhecida e admirada em um contexto de paz garantida pelo poder absoluto do exército romano?  Havia uma crescente insatisfação de muitos judeus em relação ao domínio romano, isto incitava a formação de facções político-religiosas radicais, e fanáticos e rebeldes se associavam a elas. Longe de representarem a maioria, os judeus destas facções não se conformavam em viver sob a autoridade de Roma.  Então, em maio de 66 d.C., aconteceu aquilo que foi a maior afronta para esses radicais: o procurador romano exigiu 12 talentos do tesouro do templo.  Isto foi o estopim da revolta descrita em “História dos Hebreus” (II Parte Guerra dos Judeus contra os Romanos), escrita por José Ben Mattatias, conhecido pelo nome romano de Flávio Josefo, o historiador judeu que viveu nessa época.

A insurreição, encabeçada pela seita fanática dos zelotes, se espalhou por todo o país.  Nas cidades, certos de que Roma iria contra-atacar, os revoltosos começaram a preparar-se, fortificando-as e reparando as muralhas antigas.  Em Roma, o imperador Nero designou para a tarefa de sufocar a rebelião o general Tito Flávio Vespasiano, que se tornaria imperador em 69 d.C.  Liderando três legiões de elite e muitas tropas auxiliares, Vespasiano avançou sobre a Galileia pelo Norte e levou ruína e morte às cidades por onde passava.  Milhares de judeus foram levados como escravos. Em seguida, avançou sobre a Judéia.  Enquanto isso, em Roma, Nero cometeu suicídio, o que desencadeou uma guerra civil pela sucessão ao trono.  Entre 68 e 69 d.C., três imperadores subiram ao poder e perderam a vida, até que Vespasiano foi aclamado imperador pelo exército.  Ele deixou a seu filho Tito, que também se tornaria imperador em 79, a tarefa de concluir a campanha contra os revoltosos na Palestina.

Durante os conflitos em Roma em torno da sucessão do imperador, a guerra contra os judeus permanecera paralisada, após o que, Tito avançou levando terror sobre a Judéia e, em 70, encontrava-se com um numeroso exército diante de Jerusalém. Eram quatro legiões seguidas de cavalaria, tropas de sapadores e tropas auxiliares, ao todo quase 80.000 homens.

“Quando virdes Jerusalém cercada de exércitos, sabereis que é chegada a sua desolação.  Então os que estiverem na Judéia, fujam para os montes, os que estiverem no meio da cidade, saiam, e os que estiverem nos campos não entrem nela. Pois dias de vingança são estes...” (Lc 21.20-22)._*

Jerusalém estava cheia de peregrinos que vieram para a celebração da Páscoa. O exército romano montou acampamento e Tito deu um ultimato para que se rendessem, sem que fosse ouvido.  Enquanto isso, na cidade, os radicais e os moderados lutavam entre si até que, finalmente, assumiram a defesa de Jerusalém.  As máquinas de assédio, catapultas que arremessavam grandes pedras sobre as muralhas, começaram a produzir grande estrago no lado norte da cidade.  A certa altura, acreditando na possibilidade de rendição, Tito colocou suas tropas para desfilarem, a fim de que fossem vistas pelos sitiados, mas tudo foi em vão.  Até que, numa última tentativa, Flávio Josefo, o historiador, judeu da Galileia que fora general da Judéia e que tinha se tornado prisioneiro, tentou convencer os revoltosos a se renderem, porém, sem sucesso.  O assalto então prosseguiu.

Como a cidade estava superpovoada e a escassez de alimentos há muito começara a fazer vítimas.  À noite, muitos que tentavam fugir da cidade eram capturados pelos romanos que os crucificavam.  Todos os dias em torno de 500 deles eram crucifica dos, e isto só foi suspenso quando não havia mais árvores para fornecer a madeira.  A vista que se tinha do alto dos muros da cidade era de uma “floresta de cruzes”, e o cheiro pútrido era insuportável.  Após alguns meses do início do cerco, toda a circunvizinhança de Jerusalém havia se transformado em deserto.  Tito ordenou a construção de um muro de terra em torno de Jerusalém com vários postos de vigia para garantir que a cidade ficasse totalmente isolada, nenhum suprimento entraria e ninguém sairia.  Com isto, ele acreditava que a fome convenceria os rebeldes a se renderem.  Tudo parecia em vão, pois, apesar do flagelo da fome, os sitiados não demonstravam nenhum sinal de que se renderiam. As ruas estavam cheias de mortos, pessoas enlouquecidas invadiam as casas desesperadas a procura de algo para comer.  Os ricos se desfaziam de seus bens por uma medida de trigo e chegavam a comer os grãos crus sem ao menos moê-los, por causa do medo de que Ihos roubassem.

Flávio Josefo, em sua obra sobre a Guerra dos Judeus, relata: “Jamais alguém poderia ver miséria tão deplorável... Espancavam os velhos, que não queriam entregar-lhes (algo de comer), agarravam pela garganta as mulheres que escondiam o que tinham nas mãos e sem ter nem mesmo compaixão das crianças, que ainda mamavam, atiravam-nas ao chão depois de terem sido arrancadas do peito de suas mães.” [1]

Jesus havia predito: “Mas ai das que estiverem grávidas e das que amamentarem naqueles dias!” (Mt 24.19).  Ele sabia do terrível sofrimento que as mulheres que iriam dar à luz próximo ou durante a guerra padeceriam.  Uma mulher chamada Maria, filha de uma nobre e muito rica família da Jordânia, que estava em Jerusalém para a Páscoa, havia assado algo para comer. O cheiro chamou a atenção dos zelotes que invadiram a casa onde estava e obrigaram-na, sob ameaça de morte, a mostrar o assado. Ficaram estarrecidos quando ela mostrou-lhes o que tinha: o resto do corpo de um recém-nascido já parcialmente devorado, era de seu próprio filho. A notícia da prática de canibalismo na cidade provocou revolta no acampamento romano e levou Tito a jurar que destruiria a cidade.

À medida que o tempo passava, a fome ia fazendo mais vítimas e os sobreviventes não tinham forças para enterrar os que morriam, de modo que as ruas e casas iam se enchendo de cadáveres.  Milhares que no desespero tentavam fugir da cidade à noite encontravam um destino atroz nas mãos dos romanos, porque estes acreditavam que os fugitivos engoliam pedras preciosas do famoso templo de Herodes; assim, ao tentarem escapar, eram mortos pelos romanos que abriam suas vísceras em busca delas.  Tito puniu seus soldados por essa conduta, mas eles continuaram com a atrocidade.

[1] – História dos Hebreus, vol. 8, pg. 172.

Continua...

Extraído do livro “Os Últimos Dias” do autor Ricardo L. V. Mascarenas.

Por Nivaldo Gomes.

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