[Texto Sobre Religiões Comparadas]
Por Craig
J. Hazen
[Capítulo
dez do livro:Passionate Conviction: Contemporary Discourses on Christian Apologetics,
editado por Paul Copan e William Lane Craig]
Obs.: “Traduzindo trechos
e buscando editoras interessadas na publicação”
Uma
tarde, recebi uma ligação em meu escritório na Universidade Biola de um professor
assistente de uma faculdade comunitária local. Ele estava me contatando em nome
de um professor de um curso de estudos religiosos que procurava representantes
de várias tradições espirituais para vir e falar em sua sala de aula. O
professor queria que os alunos ouvissem em primeira mão de uma ampla gama de
pensadores e devotos religiosos - uma ideia admirável, a meu ver. Eu estava
livre na manhã em que eles planejavam me ouvir, por isso fiquei encantado em ir
e me dirigir ao grupo.
Alguns
dias depois, estava em sala de aula e, depois de alguns avisos, o professor
começou a me apresentar como o orador daquela manhã. "Este é Craig Hazen,
e ele estará interagindo conosco esta manhã sob o ponto de vista de sua
tradição religiosa, o Cristianismo fundamentalista".
O
rótulo me pegou desprevenido. Eu pensei que havia sido convidado para falar
sobre uma categoria muito mais ampla, como o Cristianismo em geral, ou talvez o
Cristianismo Protestante ou o Cristianismo Evangélico Protestante - tudo o que
eu poderia reivindicar como sendo minha tradição. O termo fundamentalista
costumava ter um significado nobre, mas havia perdido esse significado há muito
tempo.
Na
rápida introdução, o professor não mencionou que eu tinha doutorado em estudos
religiosos na Universidade da Califórnia, nem que eu havia estudado no
Instituto Internacional de Direitos Humanos em Estrasburgo, França, ou que eu havia
chefiado um laboratório de pesquisa em biologia. Talvez ele não tenha
mencionado isso porque essas informações não se encaixam no estereótipo de um
fundamentalista, que passou a significar, entre outras coisas, uma espécie de
antiintelectualismo e separação da sociedade em geral. Ele sabia que eu era um
professor de algum tipo, mas provavelmente presumiu que minha educação de
pós-graduação consistisse em memorizar versos obscuros da Bíblia King James no Grover
Bible College ou que eu vivia em algum confinamento Cristão radical.
Para
criar uma imagem mais positiva o mais rápido possível, eu me apresentei e dei a
eles um pouco de conhecimento sobre meu interesse no estudo das religiões mundiais,
direitos humanos e ciência. Isso causou um pouco de confusão nos alunos, porque
eles não conectavam os chamados fundamentalistas com um trabalho acadêmico
sério, especialmente nesses tipos de assuntos.
Tomei
uma decisão rápida de virar a mesa com eles naquela manhã, fazendo algo muito
diferente de uma apresentação padrão sobre o Cristianismo bíblico. Eu lhes disse
que, devido minha formação em estudos religiosos, científicos e culturais,
queria transmitir a eles algo valioso, algum conhecimento prático que os
ajudasse de uma maneira importante.
Eu
presumi algo correto sobre os alunos. Muitos deles estavam participando das
aulas e pesquisas sobre estudos religiosos populares porque estavam curiosos
sobre as várias tradições. Em alguns aspectos, eles estavam usando essas aulas
para considerar algumas dessas religiões em um tipo de test drive que não impusesse
medo.
O
que eu propus fazer naquela manhã foi dar a eles uma visão realista de um
estudioso no assunto sobre como uma pessoa de mente aberta faria uma busca
religiosa. Aqui você está na faculdade, eu disse a eles, tentando usar
habilidades analíticas e raciocínio cuidadoso para obter conhecimento e
insights sobre assuntos que vão desde a apreciação da música à química
orgânica. Por que não devemos usar essas mesmas ferramentas cognitivas para nos
ajudar a entender o mundo aparentemente louco da religião, principalmente
porque muitos de vocês estão fazendo uma avaliação cuidadosa sobre qual
religião poderá abraçar um dia? Em outras palavras, como uma pessoa criteriosa
faria uma busca religiosa?
Os
alunos estavam genuinamente interessados nessa ideia. Não me ocorreu até mais
tarde porque eles ficaram tão fascinados com essa perspectiva. Como ocorreu, na
experiência deles, ninguém jamais vinculou as ideias do pensamento claro ou da avaliação
racional com a busca da religião - como se fossem categorias separadas
(racionalidade e religião) e que "ambas nunca se encontrariam". No
entanto, eles realmente acharam que era uma ideia nova e um ótimo gesto. Já era
quase o fim do semestre, e o professor nunca havia oferecido nada nesse
sentido, e nenhum de seus oradores convidados. Os alunos ficaram entusiasmados,
mas o tópico inteiro teve o bônus adicional de ajudar os alunos a esquecer tudo
sobre fundamentalismo. Então, com um aceno voluntário do professor da turma,
que mais tarde me disse que também queria ouvir o que eu tinha a dizer sobre um
tópico tão novo, comecei.
O
primeiro ponto que deixei claro na minha apresentação improvisada foi, na
verdade, tentar reverter e retirar o rótulo fundamentalista que o professor
havia imposto sobre mim. Os alunos se sobressaltaram com a primeira proposição
que saiu da minha boca. Com toda a honestidade, olhando para trás, eu
provavelmente disse isso sem muita ênfase, a fim de agitar um pouco as coisas.
Talvez no fundo eu quisesse despertar a atenção total dos alunos de modo a
vê-los interessados antes de entrar nos detalhes da minha palestra. Funcionou.
De fato, um surfista sonolento no fundo da sala ganhou vida depois da minha afirmação
e ficou até mesmo agitando um skate com uma mão para enfatizar certos pontos
quando ele entrou na discussão.
Qual
foi a afirmação inquietante que fiz que atraiu a ira momentânea da turma da
faculdade e fez com que seus olhos se arregalassem? Foi o seguinte: fiz a
afirmação franca de que qualquer ser pensante que estivesse em uma busca
religiosa, obviamente deveria começar essa busca explorando o Cristianismo
primeiro. Em outras palavras, uma pessoa eventualmente, tem que fazer uma
escolha sobre onde começar qualquer tipo de jornada. Se alguém quiser comprar
um carro novo, precisa decidir se deve primeiro visitar a concessionária Daewoo
ou a BMW. Deve haver alguns critérios objetivos e racionais que uma pessoa usa
para decidir onde ir primeiro para dar uma olhada - preço, proximidade, status,
reputação, qualidade e toda uma gama de preferências pessoais. Pelo menos até
certo ponto, o mesmo deve ser verdade com as tradições religiosas se você
estiver intencionalmente tentando explorá-las. Lembre-se, não estou tentando
decidir qual tradição é verdadeira neste momento, mas com que tradição faz mais
sentido iniciar a busca. Uma pessoa tem que começar por algum lugar. Penso que
o Cristianismo é, por qualquer medida racional, o lugar óbvio para um ser
pensante começar a exploração.
Depois
de alguns momentos em que os alunos conversavam agitados, disse à classe que
daria a eles quatro razões pelas quais um ser pensante, ponderado, racional em
uma busca religiosa obviamente começaria essa exploração com o Cristianismo.
Passei o resto do meu tempo com eles naquela manhã, apresentando este argumento
com muita interação e animação.
O
que se segue é o argumento que fiz para a turma. É claro que pensei bastante na
minha palestra ininterrupta e a aprofundei um pouco nessas páginas. Mas os quatro
pontos básicos são os mesmos.
Quatro Razões pelas quais um Ser
Pensante em uma Busca Religiosa Deve Começar essa Busca Pelo Cristianismo
1. O Cristianismo Pode Ser Averiguado
Eu
disse aos alunos naquela manhã que, no centro da tradição Cristã, há afirmações
sobre Jesus - Sua vida, Seus ensinamentos, Sua morte e Sua ressurreição - que podem
ser averiguadas. O que quero dizer com isso é que essas afirmações são tais que
qualquer ser pensante pode examinar as evidências e razoavelmente determinar se
as afirmações são historicamente precisas ou justificadas. Penso que esta é uma
das principais razões pelas quais uma pessoa ponderada, que estuda as várias
tradições religiosas, obviamente começaria com o Cristianismo. O Cristianismo é
único, pois na verdade convida as pessoas a investigar cuidadosamente suas
reivindicações sobre Deus, a humanidade, o universo e o significado da vida.
Uma
passagem na Bíblia apóia essa noção, e considero que é uma das passagens mais
estranhas de toda a literatura religiosa. No Novo Testamento, o apóstolo Paulo
escreve algo que é um pouco chocante, devido a maneira como normalmente
pensamos sobre religião e fé no mundo moderno. Nesta passagem, Paulo está
discursando sobre a visão Cristã da vida após a morte. Mas então, no meio do
discurso, ele diz algo que parece surpreendente para nossas sensibilidades
comuns sobre religião. Ele diz: "Se Cristo não ressuscitou [dentre os
mortos], nossa pregação é inútil e sua fé também." Talvez apenas para
garantir que não fiquemos confusos sobre o que ele está dizendo aqui, ele
repete a ideia vários versículos depois. "E se Cristo não ressuscitou, sua
fé é inútil" (1 Cor 15: 12-19 ESV, grifo meu).
Agora,
por que eu consideraria essa uma das passagens mais estranhas de toda a
literatura religiosa? Por esse motivo: não consegui encontrar uma passagem nas
Escrituras e ensinamentos de outras grandes tradições religiosas que vincule
tão firmemente a verdade de todo um sistema de crenças a um único evento
histórico que pode ser averiguado. A verdadeira "fé" nessas
declarações parece estar invariavelmente ligada à verdade de uma ocorrência no
mundo real. O que o apóstolo Paulo disse aqui foi radical no contexto da
maioria das tradições religiosas. Ele disse, em essência, que se Jesus não tivesse
ressuscitado dos mortos (em seu próprio corpo transformado, mas ainda físico,
como declararam as testemunhas e as Escrituras), se isso realmente não ocorreu
no tempo e no espaço, então o Cristianismo é apenas uma fuga; nossa fé Cristã é
inútil, sem utilidade ou fútil.
Essa
ideia de que a verdade do Cristianismo está ligada à ressurreição de Jesus de
uma maneira testável diferencia o Cristianismo das outras grandes tradições
religiosas do mundo de maneira dramática. As religiões asiáticas históricas, em
geral, nem discutem contra esse ponto. Quando você resume tudo, o Hinduísmo, o Budismo
e religiões do gênero tratam de experiências pessoais internas e não de um
conhecimento público objetivo. Outras tradições parecem estar alicerçadas sobre
o conhecimento objetivo até que você faça uma sondagem um pouco mais profunda.
O Mormonismo, por exemplo, parece se basear sobre placas de ouro ocultas, a
antiga visita de Jesus ao hemisfério ocidental e aos profetas dos últimos dias
- coisas que certamente poderiam, em princípio, ser avaliadas de maneira
objetiva. Contudo, ao enfrentar evidências contrárias a essas alegações, o
missionário, estudioso ou apóstolo Mórmon recua e começa a falar sobre o
conhecimento interno especial, um “ardor no peito”, que é a única confirmação
que realmente importa sobre essas histórias incomuns. No fim, o Mórmon não é
diferente do Budista, pois ambos confiam na experiência interior como sua fonte
última e garantia de conhecimento religioso.
É
por isso que o Cristianismo é único e é por este movito que um ser pensante em
uma busca religiosa, seria sábia em iniciar a busca com o Cristianismo; o
Cristianismo é realmente testável. Se Jesus não ressuscitou dos mortos após ser
executado por uma equipe Romana de crucificação na Jerusalém do primeiro
século, então, segundo o apóstolo Paulo, o Cristianismo simplesmente não é
verdadeiro. O Cristianismo convida abertamente as pessoas a investigar suas
reivindicações de forma objetiva.
2. No Cristianismo a Salvação é um Dom
Gratuito de Deus
Quase
todas as vezes que falo no campus de uma faculdade sobre por que um ser
pensante deveria iniciar sua busca religiosa pelo Cristianismo, me pergunto se
realmente preciso das quatro razões. As duas primeiras razões são tão poderosas
que, em minha mente, elas podem sustentar o argumento sem muita ajuda das
outras duas que apresento.
Esta
não é uma conclusão difícil de se chegar. Pense nisso. E se alguém viesse até
você na esquina e lhe apresentasse um novo caminho para Deus? Durante a
apresentação, fica claro que as ideias oferecidas não são de forma alguma
testáveis, de modo que você nunca pode saber objetivamente se elas são
verdadeiras. Além disso, o esboço apresentado de Deus é que Ele exige muito de
você. Você deve se esforçar heroicamente para mudar a maneira como pensa, sente
e se comporta em todos os pontos de sua vida, a fim de agradar a Deidade e
seguir adiante no caminho da salvação ou da iluminação. De fato, pode ser que
você precise se esforçar heroicamente por muitas vidas para alcançar a salvação.
Claro, há uma reviravolta lógica final aqui. Se você não tem como avaliar se o
sistema religioso básico é verdadeiro, também nunca poderá saber se o seu esforço
intenso para agradar a Deidade foi suficiente ou se você estava fazendo as
coisas certas da maneira certa. Mesmo se no final um sistema religioso como
esse for verdadeiro, não faz muito sentido alguém explorar as várias opções
religiosas para iniciar a exploração com esse sistema.
Por
outro lado, o que aconteceria se alguém lhe chegasse na mesma esquina e lhe
apresentasse um sistema religioso testável, abrindo assim a possibilidade para
você fazer uma investigação vigorosa de suas alegações. Além disso, o sistema apresenta
uma figura de Deus como um Pai amoroso que deseja dar o dom gratuito da
salvação a qualquer um que o receber. Preciso dizer mais? Se esse sistema
testável e livre descreve com precisão o Cristianismo e se o sistema difícil e
que não pode ser testável descreve com precisão as outras opções religiosas,
não vejo como pessoas razoáveis não iniciariam sua busca com o Cristianismo. Pois
pareceria um acéfalo de proporções olímpicas.
O
Cristianismo é singular em sua oferta de salvação somente pela graça, um dom
gratuito de Deus para quem quiser recebê-lo. Na história da religião, houve
apenas alguns exemplos de um movimento religioso que considerou a salvação ou a
iluminação um presente gratuito de uma divindade. Mas mesmo nesses casos (como
no Budismo Amida ou em uma certa forma de Hinduísmo Bhakti), não é um tipo de dom
gratuito sem obras. Ainda há obras a serem feitas por parte dos devotos.
Portanto,
a tradição Cristã está em um lugar solitário no espectro das religiões do
mundo, quando o apóstolo Paulo escreve em Efésios 2: 8–9: “Porque pela graça
sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das
obras, para que ninguém se glorie;”.
A
salvação no Cristianismo é um dom gratuito e, portanto, está igualmente
disponível para qualquer pessoa. Você não precisa ser uma super estrela
espiritual, de nascimento nobre ou altamente educada. Qualquer um pode vir,
como às vezes cantamos em reuniões de avivamento, "exatamente como eu
sou". Esta é uma característica atraente e única e faz do Cristianismo uma
escolha óbvia como ponto de partida para uma busca religiosa.
3. No Cristianismo Você Percebe uma
Visão de Mundo Maravilhosa e Coerente
Se
você está tentando priorizar um grupo de religiões para saber qual delas deve
verificar primeiro, seria extremamente útil saber quais das religiões apresentam
uma imagem do mundo que se aproxime mais de uma correspondência real com a
forma com que o mundo realmente é. Se tal semelhança pudesse ser determinada, tenho
certeza que essas informações daria aos seres pensantes muita confiança de que
eles fizeram uma boa escolha sobre o ponto de partida nessa busca.
Deixe-me
abordar esse ponto a partir de outra direção. Parece-me razoável que uma pessoa
sensata não queira iniciar sua busca religiosa com uma religião que pareça ter
uma tremenda dificuldade em entender o mundo em que vivemos. O problema aqui é
que o mundo em que vivemos diariamente é uma das únicas fontes de dados com as
quais trabalhamos na avaliação de todos os tipos de alegações, inclusive
religiosas.
Portanto,
se você tem a opção de estudar sob um guru cuja missão é revelar ao mundo que a
superfície da lua é composta de sorvete spumoni, ou sob alguém que pensa que a
camada externa da lua é formada primariamente de rocha anortosita, uma pessoa
sensata seguiria aquele cujo ensino parece ter a melhor correspondência com a
forma como o universo realmente é. Esse é o princípio geral que estou tentando
comunicar com este terceiro motivo.
Dizer
que a visão Cristã do mundo é a que melhor se ajusta à maneira como o mundo
realmente é, é uma afirmação ousada, simplesmente porque há muito que
precisaria ser examinado para descobrir se essa afirmação é justificada.
Afinal, a lista de coisas para comparar parece interminável. Mas, da minha
perspectiva, o que aprendi sobre as várias religiões e sobre o mundo em geral
torna essa afirmação totalmente plausível. Como obviamente não posso explorar
todos os aspectos do mundo (da cosmologia à cosmetologia) para demonstrar em
apenas algumas páginas que esse procedimento é razoável, usarei um exemplo
profundo para ilustrar o ponto: o problema do mal, da dor e do sofrimento.
Todo
ser humano observa o mal e experimenta dor e sofrimento quase diariamente.
Parece óbvio que qualquer religião que não faça justiça a essas experiências
humanas comuns provavelmente não deve estar no topo da lista para uma pessoa
sensata e racional em sua busca religiosa. Como as várias tradições religiosas
explicam esses fenômenos ou os entendem?
Os
devotos das tradições religiosas orientais, como o Budismo e o Hinduísmo,
certamente encontram os mesmos tipos de mal, dor e sofrimento que outras
pessoas ao redor do mundo experimentam. Mas professores, pensadores e líderes
desses movimentos têm uma maneira diferente de lidar com a experiência, diferente
do que normalmente fazemos no mundo Ocidental. As tradições orientais
normalmente colocam o mal, a dor e o sofrimento na categoria de ilusão. O
sofrimento pode, portanto, ser superado através da compreensão de sua
verdadeira natureza. O mal e a dor desaparecem à medida que o devoto obtém
esclarecimento sobre a natureza ilusória do mundo fenomenal. Como um famoso
lama Tibetano me escreveu em uma carta certa vez, depois de eu ter dado uma
palestra sobre o Budismo, "o mal e o sofrimento são reais apenas enquanto
o ego acreditar que eles são reais". O lama coloca o problema com as
palavras mais simples possíveis para fins práticos. Sua solução para o mal e o
sofrimento foi mudar a maneira como acreditamos sobre o problema. Eles então deixarão
de ser reais.
Finalmente
chegou a hora de fazer a grande pergunta. Se estamos em busca de uma visão de
mundo que corresponda à realidade do mundo, como podemos avaliar essas
abordagens sobre o mal? Depois de conversar um pouco com os alunos sobre essa
questão, dei a eles a ilustração a seguir.
Tenho
filhos gêmeos e, quando eles eram bebês, eles encenavam um personagem de uma
comédia de TV muito apreciada. Minha esposa e eu estávamos com frequência no
set de filmagens cuidando de nossos filhos quando eles não estavam ensaiando ou
filmando. Vários escritores e membros do elenco ouviram dizer que eu era algum
tipo de professor de religião e acharam interessante discutir algumas de suas
ideias religiosas comigo. Certa vez, durante o jantar, antes de uma filmagem
noturna, lembro-me de ouvir uma delas descrever detalhadamente os ensinamentos
de um novo guru que ela estava seguindo. Embora parte disso me parecesse um
pouco desagradável, era fácil sentar e ouvir, porque era muito interessante ver
como os conceitos religiosos orientais estavam sendo incorporados à mentalidade
de Hollywood. Um dos pontos que essa mulher estava defendendo era que seu guru
pensava que o bem e o mal não eram reais e poderiam ser transcendidos através
de "visões corretas". Depois de ter experimentado vários tipos de
comida (a culinária servida foi excelente nesse dia de apresentação) e alguns
cappuccinos, a mulher finalmente pediu minha opinião sobre tudo isso, e ela havia
falado sobre uma série de tópicos. Eu só fiz uma pergunta e não perguntei de
forma provocativa ou atrevida. Eu estava genuinamente curioso para saber o que
ela responderia. Apenas achei que essa pergunta simplesmente manteria a
conversa em andamento. Perguntei: "O que seu guru diria sobre o
Holocausto?"
Várias
coisas aconteceram no momento que fiz a pergunta. Eu não tinha percebido que
várias pessoas sentadas nas proximidades já estavam sintonizadas em nossa
conversa há algum tempo. Mas agora elas não estavam mais fingindo comer. Elas levantaram
a cabeça e viraram em nossa direção. Acontece que um bom número do elenco,
equipe e membros da produção eram Judeus. Como você pode imaginar, eles também ficaram
interessados na resposta à pergunta. A mulher com quem eu estava conversando
não notou que uma audiência havia crescido sutilmente ao nosso redor. Ela
estava ocupada pensando nas implicações da pergunta. Ela ficou branca; e pelo
olhar em seu rosto, parecia que toda a sua visão de mundo estava implodindo
dentro de sua cabeça. Veja bem, ela também descendia de uma família Judia. E
embora ela fosse jovem demais para ter se envolvido no horror do holocausto e
nem sequer praticasse a fé de sua família, ela conhecia muito bem as histórias
de horror de sua família, família grande e suas conexões culturais Judaicas que
o Holocausto era um capítulo decisivo em sua própria identidade e estilo de
vida. O Holocausto era real e não podia ser negado em nenhum sentido - nem
historicamente, nem emocionalmente, nem moralmente.
De
alguma forma (e eu já vi isso acontecer com frequência), essa mulher estava
completamente cega para umalacuna na sua visão das coisas enquanto aprendia com
seu novo guru. Como ela pôde se aprofundar tanto nos ensinamentos de seu guru
sobre o mal ser uma ilusão e ainda levar a sério o sofrimento impensável que os
Judeus da Europa sofreram? Ela não poderia. E certamente não foi nada que eu
disse. Aconteceu que eu estava lá quando ela teve um momento de iluminação de
um tipo diferente: uma percepção de que uma visão de mundo que tenta descartar
tais males, dores e sofrimentos tão profundos como ilusão simplesmente não é um
guia viável para a vida.
Toda
religião deve tentar entender o mal, porque o mal é um fenômeno universal e
sério. E toda religião labuta nessa tarefa. As Escrituras do Cristianismo
confrontam a questão do mal desde as primeiras páginas de Gênesis. Há uma seção
inteira da Bíblia, o livro de Jó, dedicado às perguntas não respondidas envolvidas
no sofrimento pessoal. Embora a Bíblia nunca forneça uma resposta para as
perguntas dos casos individuais de sofrimento (como, por que o motorista bêbado
me atropelou?), Ela fornece o contexto mais satisfatório para aceitar a
existência do mal.
Embora
eu acredite que a abordagem bíblica para o problema do mal seja verdadeira, não
estou discutindo esse ponto aqui (existem muitos livros persuasivos que
argumentamefetivamente sobre o assunto). Estou tentando fazer uma afirmação mais
modesta de que, se a escolha entre uma visão de mundo que simplesmente
desconsidera a dor e o sofrimento como algo não é real, e uma visão de mundo
que admite que o sofrimento realmente existe, com qual você começaria se
estivesse procurando uma religião? Isso é realmente muito análogo à pergunta
que fiz no início desta seção. Você estaria mais inclinado a seguir um guru que
ensinava que a superfície da lua era feita de sorvete spumoni ou alguém que
ensinava que a superfície da lua era composta de rocha anortosita? Dizer que o mal
é uma ilusão é como dizer que a superfície da lua é feita de espumoni. Podemos
afirmar, com razão, ter conhecimento de que ambas as afirmações não são
verdadeiras. Uma boa visão de mundo lida com o óbvio; não o descarta.
O
que venho afirmando com ousadia desde o início é que oesboço que o Cristianismo
apresenta do mundo realmente corresponde, melhor do que qualquer outra opção
disponível, à maneira como o mundo realmente é. Obviamente, como previ no
começo, não cheguei nem perto de provar esse ponto, porque teria que explorar
muitas questões com grande profundidade. Mas eu (e, mais importante, toda uma
multidão de pessoas muito mais espertas do que eu em nossos dias e ao longo da
história) cheguei à conclusão de que a visão Cristã básica do mundo é a únicaopção
se alguém está procurando pelo que melhor se ajusta.
4. O Cristianismo tem Jesus como o
Centro
O
tempo que recebi para a palestra como convidado para os estudantes
universitários estava quase no fim. Eu estava falando rápido a manhã toda para
tentar resumir todas as minhas razões pelas quais uma pessoa sensata em uma busca
religiosa deveria iniciar essa busca com o Cristianismo. Eu achava que havia
desenvolvido um bom argumento. Os alunos estavam atentos e, portanto, presumi, estavam
interessados no que eu tinha a dizer. No entanto, quando apresentei minha
quarta razão, as coisas ficaram inesperadamente ácidas por um momento. Afirmei
que uma boa razão para começar com o Cristianismo era que ele tinha Jesus como
o ponto central incontestável da tradição. O aluno com o skate imediatamente
entrou na conversa. Ele observou que era interessante que eu tivesse esperado
até o fim para sair com uma razão tão controversa, uma razão que parecia muito
mais evangelismo direto do que qualquer outra coisa.
Eu
olhei para o professor da turma que estava sentado no final da primeira fila.
Perguntei-lhe se ele tinha algum espaço durante o semestre para rever as
opiniões sobre Jesus entre as religiões do mundo. Ele disse que não tinha e me
deu permissão para resolver, se eu quisesse. Aceitei a oferta.
Eu
pude entender por que o “cara do skate” e outras pessoas da classe tiveram um
problema inicial com o meu argumento sobre Jesus. Eles estavam perdendo algumas
informações cruciais, e estavam entendendo mal as implicações das minhas
observações. Jesus é sem dúvida o personagem mais próximo que o mundo tem de
uma figura religiosa universal. Quase toda tradição religiosa quer
reivindicá-lo como seu de uma maneira ou de outra. Meu comentário de que
"o Cristianismo tem Jesus no centro" não é uma afirmação insensata de
minha própria posição religiosa. Antes, é um argumento que se Jesus é uma
figura tão atraente que as pessoas religiosas do mundo querem cooptá-Lo para
suas próprias tradições, faz todo o sentido dar uma atenção especial ao Cristianismo
- a tradição que tem Jesus plantado firmemente no centro e reivindica Jesus
como seu fundador.
Certamente,
essa não é uma afirmação bruta de favoritismo religioso - exatamente o oposto.
É outro motivo forte para uma pessoa sensata iniciar uma exploração religiosa
com o Cristianismo. Muitas perspectivas religiosas querem reivindicar Jesus
como seu.
Veja
o Hinduísmo, por exemplo. Muitos professores e eruditoshindus proclamaram Jesus
como um dos dez avatares de Vishnu ao lado de Rama e Krishna. Vishnu é uma das
principais divindades no panteão hindu de deuses, e um avatar é "aquele
que desce". Portanto, não é incomum encontrar Jesus estabelecido como uma
espécie de encarnação do Senhor Vishnu. Essa certamente não é a figura do Jesus
histórico como documentado, mas demonstra o respeito e a influência que ele influi
entre muitos hindus fiéis. Não é incomum para um hindu reverenciar Jesus ao
ponto de venerá-lo, porque Ele é uma figura tão impressionante.
Da
mesma forma, não é incomum para os Budistas das tradições Mahayana posteriores
ver Jesus como uma figura espiritual proeminente. Freqüentemente, ele é
considerado um grande bodhisattva - ou seja, alguém motivado pela compaixão a
se afastar do limiar do nirvana para ajudar os outros no caminho do despertar.
Os Budistas costumam acreditar que durante seus dias na terra, Jesus ofereceu
todo o ensino Budista (dharma) ao qual Sua geração estava aberta. Alguns até O
vêem como o maitreya bodhisattva, um ser messiânico iluminado no céu de Tusita,
aguardando Sua última reencarnação. O líder Budista Tibetano, o Dalai Lama,
disse em várias ocasiões não ser digno de ser comparado com Jesus, acreditando
que Jesus é um "ser totalmente iluminado".
O
Islã é um caso especialmente interessante. Não se poderia deduzir das abordagens
populares do Islã que Jesus entra nesseesboço religioso. Mas os muçulmanos
conhecedores e seus textos dão uma visão mais ampla. Se o profeta muçulmano
Muhammad e Jesus se enfrentassem em um concurso simples, onde seus atributos
especiais fossem registrados, Jesus venceria de pelo menos seis a um. Muhammad
era um profeta. De acordo com o Alcorão e a tradição islâmica, Jesus também era
um profeta. No entanto, ao contrário de Muhammad, Jesus nasceu de uma virgem, operou
milagres, foi levado para o céu por Alá sem passar pela morte, foi chamado de
Palavra de Deus e voltará a aparecer para todos antes do julgamento final -
tudo de acordo com o Alcorão. Agora, claramente, Muhammad é considerado o maior
profeta porque trouxe a mensagem final de Allah à humanidade [segundo o Islã].
Mas Jesus é uma figura reverenciada, perdendo apenas para Muhammad em honra e
respeito. Ele certamente não é considerado divino pelos muçulmanos, mas é
considerado um pináculo de justiça e um objeto inegociável da crença muçulmana.
É
claro que o número de entusiastas de Jesus não termina aí. É difícil encontrar
uma tradição maior ou um movimento menor que não Lhe dê um lugar especial de
honra e que não procureuma maneira significativa de envolvê-Lo em seu sistema
de crenças. Os Bahá'ís, os Sikhs, os Mórmons, o Movimento da Nova Era, os Unitaristas,
as Ciências Religiosas, as Testemunhas de Jeová, os Jainistas, os Deístas e
muitos outros encontram uma maneira de colocar a “mão na mão do homem da
Galiléia.”
Desde
que Jesus é, de qualquer forma, a única pessoa religiosa universal, uma figura
tão imponente que quase todo corpo religioso precisa encontrar uma maneira de
trazê-lo para o seu ladoa qualquer custo, faz todo o sentido para mim que
alguém em uma busca religiosa saiba exatamente por onde iniciar.
Meu
tempo oficial na frente da turma de estudantes universitários havia terminado,
mas a discussão certamente não terminou. Pelo menos uma dúzia de estudantes me
seguiu pela porta, e nos sentamos em algumas mesas do lado de fora e discutimos
grandes questões religiosas por várias horas. Mesmo que minha palestra acabasse
sendo uma apresentação bastante Cristocêntrica, os alunos não se deixaram levar
por isso. Essas são questões difíceis e pareciam apreciar não apenas a minha
posição, mas o convite a um exame cuidadoso das minhas próprias conclusões.
Como uma jovem disse ao final de nosso tempo juntos: “Do que temos tanto medo?
Deveríamos estar fazendo as perguntas mais difíceis, e os líderes e professores
religiosos devem estar preparados com respostas honestas. Se existe um Deus,
uma coisa é certa: Ele nos fez seres pensantes. Enquanto formos gentis uns com
os outros, poderemos discutir essas coisas abertamente.”
Ela
está certa: não devemos ter medo. O comentário dela me lembrou uma famosa frase
do apóstolo Pedro no Novo Testamento - realmente uma ordem para todos os
crentes Cristãos. “Antes,
santificai ao Senhor Deus em vossos corações; e estai sempre preparados para
responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança
que há em vós,” (1 Pedro 3:15).
____________________
Fonte:
HAZEN, Craig J. Christianity in a World of Religions.In COPAN, Paul; CRAIG, William Lane
(General Editors). Passionate Conviction: Contemporary Discourses on Christian Apologetics.
Nashville, Tennessee: B&H ACADEMIC, 2007.
Tradução Walson Sales.
____________________
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