Há muitas obras famosas perdidas que eu gostaria de ler. Outro dia estava imaginando como seria interessante ler uma das mais importantes obras de Tertuliano que lamentavelmente foram perdidas na história: a sua obra em seis volumes “De Ecstasi”, onde faz uma apologia da manifestação dos carismas entre os montanistas. Mas, a vida é assim mesmo. A história da humanidade está repleta de livros famosos perdidos.
“Margites”, uma das obras mais afamadas atribuídas a Homero, nunca chegou aos nossos dias. Sabemos dela hoje porque alguns autores da Antiguidade a citam, como Platão e Aristóteles – este, inclusive, afirma que ela era uma obra excepcional. Mais precisamente, Aristóteles afirma que “Margites” estava para a comédia como a “Ilíada” e a “Odisseia” estavam para a tragédia.
A peça “Cardênio”, de Shakespeare, um sucesso em seus dias, está completamente perdida. Shakespeare a teria escrito após ler “Dom Quixote”, de Cervantes, onde há um personagem de mesmo nome.
Na Bíblia, temos vários livros citados que não chegaram até os nossos dias, como “O Livro das Guerras de Javé” (Nm 21.14-15), “O Livro do Justo” (2Sm 1.18), “O Livro dos Atos de Salomão” (1Rs 11.41), outras obras de Salomão que não chegaram até nós (1Rs 4.32,33), “O Livro das Crônicas dos Reis de Judá” (1Rs 14.29), “Os Livros de Aías” (2Cr 9.29), “O Livro de Ado” (2Cr 9.29; 12.15; 13.22), “O Livro de Semaías” (2Cr 12.15), “Os Comentários de Jeú” (2Cr 20.34), “Os Livros dos Videntes” (2Cr 33.19) e a verdadeira “Primeira Carta de Paulo aos Coríntios” (1Co 5.9 - a primeira, na verdade, seria a segunda).
Além disso, muitos outros grandes títulos da história da humanidade, que hoje sequer temos ao menos registros deles, não puderam chegar até nós. Lembre-se, por exemplo, dos mais de meio milhão de volumes da Biblioteca de Cartago, que ardeu durante dias até o último volume virar literalmente cinzas. Recorde a história dos mais de 700 mil volumes da célebre Biblioteca de Alexandria, consumidos por um incêndio involuntariamente causado por Júlio César na sua invasão à cidade egípcia. Há historiadores que acreditam que uma pequena parte da biblioteca teria sobrevivido ao incêndio romano, mas, séculos depois, essa biblioteca bastante diminuída acabou desaparecendo. Há ainda os mais de 300 mil livros queimados por Leão III, o Isáurio, em Constantinopla, no oitavo século da Era Cristã. Há muitos episódios assim na história.
Há uma história contada em uma crônica de Sérgio Faraco em “Livros Perdidos in Gregos e Gringos” (Ed. Mercado Aberto, Porto Alegre, 1998) que dá um exemplo dessas perdas. Diz Faraco:
“Conta o inglês Andrew Thomas – e isto não é ficção – que certa vez houve um grande indêndio no harém de um sultão do Império Otomano. Um jovem secretário da Missão Francesa viu saqueadores invadirem o palácio para roubar objetos de valor, e uma dramática coincidência o levou a esbarrar num homem que fugia sobraçando um monumental cartapácio. Era a ‘História de Roma’, de Tito Livio, até então desaparecida. O funcionário interceptou o ladrão e ofereceu-lhe considerável soma em troca da preciosidade. O turco aceitou, mas o francês – que fatalidade! – só dispunha de escassas moedas na algibeira. Aflito sugeriu que o pagamento fosse feito em sua residência e ainda discutiam quando vieram abaixo as traves do palácio em chamas. A multidão recuou em pânico e separou os dois homens, que não mais puderam reencontrar-se. O volume abarcava sete séculos e meio da história romana, e de seus 142 livros chegaram até nós, por outros caminhos, apenas 35”.
Uma pena, realmente. Mas, lembremos que “não há limites para a produção de livros” (Ec 12.12); que, mesmo tendo perdido muitas informações ricas do passado, puderam atravessar os séculos algumas preciosidades que ajudaram a fundar a nossa civilização; e que não perdemos também a mais importante de todas as obras: O Livro, a Bíblia Sagrada, a Palavra de Deus, lâmpada para os nossos pés e luz para o nosso caminho. Esta foi preservada, sobretudo, pela ação divina. Não há dúvida quanto a isso.
Silas Daniel
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