Por Walson Sales
Por presunção eu quero me referir a uma determinada percepção, pensamento ou ideia que é tida como verdadeira e frequentemente usada como base para outras ideias, embora não seja possível ser conhecida com certeza científica ou que não esteja ao alcance da ciência. O filósofo William J. Wainwright explica o significado da crença na presunção do teísmo. Ele defende que tendo em vista a crença em um “universo sublime”[1] ser uma crença natural, a presunção fica a favor da convicção religiosa. Contudo, algumas coisas podem ser ditas sobre a expressão crença natural. Primeiro, a crença natural pertence a um senso comum ingênuo (ou seja, ela não é produzida por reflexão sofisticada, apesar de ser possível chegar a mesma conclusão por meio da reflexão); ela não depende de justificação racional (ou pelo menos não são afetadas por desafios sofisticados, mas também, do mesmo modo, há uma justificação axiomática[2] inerente); terceiro, deve ser crida, se devemos agir corretamente, pois por exemplo, não reconhecer a existência de outras mentes impediria a própria vida racional e o discurso); e em quarto lugar, ela é um fenômeno universal. Crenças naturais incluem nossas crenças em um mundo externo, em outras mentes e na uniformidade da natureza. O conceito de crença natural é de David Hume.[3] Há ainda um grande apoio evidencial para a defesa da crença de que um universo sublime é também uma crença natural no sentido que Hume deu a essa expressão. Uma das evidências mais impressionantes é a ‘universalidade virtual de todas as ideias e práticas de toda a vida humana serem reconhecidamente religiosas’,[4] e a surpreendente sobrevivência dessa crença na União Soviética e na China Comunista. Existem ainda outras evidências, por exemplo, o autismo e o dano no lóbulo frontal faz com que as pessoas percam a capacidade para a crença religiosa, o que sugere que essa capacidade é parte de nosso equipamente psicológico normal.[5] Logo, se o Cristianismo ou alguma outra forma de teísmo tradicional é verdadeiro, então a religiosidade natural da humanidade foi implantada pelo Deus que nos criou e confirma a realidade do “universo sublime”. O que sugere a presunção do ateísmo? A descrença requer a supressão dos instintos religiosos naturais. Se é racional acreditar em nossas faculdades e instintos naturais na ausência de razões convincentes, a presunção está em favor da crença religiosa, bem como o ônus da prova está do lado que nega, pois a esmagadora maioria dos seres humanos acredita que o argumento a favor da “existência de outras mentes” ou que “o mundo externo é real” é mais forte do que o argumento que nega. Veja, por exemplo, esse silogismo sobre a existência de outras mentes:
1. nossa experiência parece nos apresentar a existência de outras mentes;
2. não existem razões convincentes para pensarmos que nossa experiência é enganosa; e,
3. nossa disposição para crer que outras mentes existem é virtualmente irresistível (WAINWRIGHT 2003, p. 82).
A principal presunção ou pressuposição do teísmo é irresistível no sentido de que há apoio natural para tal crença e que a negação de tal crença não parece ser solidamente justificada, pois pressupõe a supressão de tais instintos naturais que são inatos nos seres humanos.
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Referências:
WAINWRIGHT, William J. The Burden of Proof and the Presumption of Theism. In WALLACE, Stan W. (ed.). Does God Exist? The Craig-Flew Debate. Burlington, USA: Ashgate Publishing, 2003
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Notas:
[1] Por “Universo sublime” se entende por um universo mais espiritual [do que o mundo visível] que apresenta seu significado principal. Um ‘eu’ mais amplo, por onde vem as experiências de salvação e mostra um poder maior que é amigável a nós e aos nossos ideais. William James, Varieties of Religious Experience (New York: Modern Library, 1902), pp. 475, 505, 515.
[2] Por Justificação Axiomática eu quero dizer: teoria coerente e sistemática formada inicialmente por um conjunto organizado de noções primitivas admitidas sem demonstração, os axiomas, a partir dos quais é possível definir e demonstrar outros termos logicamente dedutíveis.
[3] David Hume foi um filósofo, historiador e ensaísta britânico nascido na Escócia que se tornou célebre por seu empirismo radical e seu ceticismo filosófico. Ele é famoso por seu conhecido argumento contra os milagres.
[4] John Hick, An Interpretation of Religion (New Haven, CT: Yale University Press, 1989), p. 21.
[5] Ellen Kappy Suckiel, Heaven’s Champion: William Jame’s Philosophy of Religion (Notre Dame Press, 1996), pp. 66-68. O que acontece aparentemente é que o dano neurológico causa uma incapacidade para experimentar sentimentos de ‘respeito e admiração religiosos’ e outras respostas do afeto para a formação de uma crença religiosa vital.
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