Jack Cottrell
Um dos
problemas mais desconcertantes na teologia é como Deus pode manter Sua absoluta
soberania enquanto considerando o homem completamente responsável pelo seu
pecado. Se Deus é soberano, ele não deve ser a causa última e determinante de
tudo, incluindo os assim chamados atos livres dos homens? E se assim for, não
devemos então concluir que o homem não é realmente livre e que ele não é
responsável por suas ações? Por outro lado, se o homem é realmente livre para
escolher entre o bem e o mal, ele não deve então ser a causa última de suas
próprias ações? E se assim for, não devemos concluir que Deus é menos do que
soberano? Há alguma maneira de solucionar o problema da soberania divina e da
responsabilidade humana?
A teologia
reformada enfatiza a natureza aparentemente contraditória deste e de outros
problemas de doutrina, não obstante declara que a incapacidade para entender
completamente tal antinomia não é razão suficiente para a rejeição de qualquer
parte dela. A teologia reformada mantém tanto a absoluta soberania divina
quanto a completa responsabilidade humana, apelando para a distinção entre
causas imediatas e últimas como a possível solução ou ao menos como um modo
antropomórfico de entender a relação entre a soberania e a responsabilidade. O
próprio homem é dito ser a causa imediata, enquanto Deus é a causa real e
última, dos atos livres dos homens. A escolha última não é atribuída ao homem.
Como a assim
chamada teologia arminiana aborda o problema da soberania e responsabilidade? A
resposta é que o Arminianismo também defende a soberania de Deus e a completa
responsabilidade do homem, embora não no mesmo sentido que o Calvinismo. O
homem é dito ser, não simplesmente a causa imediata de seus próprios atos livres,
mas a causa última deles. O homem é dito ter completa liberdade da vontade no
sentido de ser capaz de escolher tanto o bem quanto o mal.
A doutrina
arminiana do livre-arbítrio é, obviamente, fortemente negada pelos calvinistas.
É dito que tal noção de livre-arbítrio é uma negação real da absoluta soberania
e da responsabilidade por abolir justamente a soberania. Tal doutrina do
livre-arbítrio impediria a soberania de Deus, eles afirmam.
Esta é de fato
uma acusação grave, e é este mesmo problema que eu proponho lidar neste ensaio.
É verdade que a assim chamada doutrina arminiana do livre-arbítrio faz Deus
qualquer coisa menos que soberano? Se o homem tem o poder último de escolha
entre o bem e o mal, a soberania de Deus é excluída desde o começo? Como a
pergunta é feita, não é inteiramente nem mesmo fundamentalmente um problema do
que a Bíblia ensina. É mais um problema teórico ou lógico. A idéia da acusação
parece ser que o entendimento arminiano do livre-arbítrio logicamente requer
uma negação da soberania de Deus. É neste nível, então, que eu proponho
discutir o problema: há uma incompatibilidade lógica entre a soberania de Deus
e o livre-arbítrio do homem?
A esta altura
os termos livre-arbítrio e soberania devem ser mais cuidadosamente definidos. Neste
ensaio, livre-arbítrio é entendido como a capacidade de escolher livremente
entre o bem e o mal, sendo a escolha, na verdade, determinada pela vontade do
homem e não pela vontade de Deus. Por exemplo, quando o convite do evangelho é
oferecido, supõe-se que o homem tem a capacidade para aceitá-lo ou rejeitá-lo
por um ato de sua própria vontade. O uso do termo soberania neste ensaio pode
melhor ser explicado dizendo que ele significa que o decreto de Deus inclui
todas as coisas, que o controle de Deus é absoluto e sobre todas as coisas, e
que o conhecimento de Deus é completamente independente e inclui todas as
coisas. Podemos agora virar nossa atenção para o problema como foi previamente
identificado, a doutrina do livre-arbítrio faz Deus qualquer coisa menos do que
absolutamente soberano?
I. A ACUSAÇÃO EXPLICADA
Neste momento,
uma explicação mais completa da acusação contra o Arminianismo deve ser dada.
Sobre o decreto de Deus, é dito que o Arminianismo não permite que “tudo que
acontece” acontece de acordo com o conselho de Deus.[1] Dizem que a doutrina
arminiana da responsabilidade pressupõe a rejeição da idéia de que o plano de
Deus inclui todas as coisas.[2]
Sobre o
controle de Deus, é dito que o Arminianismo atribui ao homem uma medida de
causa última, e assim, por implicação, os arminianos devem crer num Deus que é
confrontado com aquilo sobre o qual ele não tem nenhum controle.[3] Dizem que o homem tem
poderes próximos ao de Deus em tal doutrina.[4] Dizem que o arminiano
assume que os fatos que acontecem como resultado das decisões do homem
acontecem independentemente do plano de Deus.[5]
Dizem que a idéia de liberdade credita uma medida de independência contra Deus.[6]
Sobre o
conhecimento de Deus, dizem que a posição arminiana leva à conclusão de que
Deus não conhece tudo pois ele não controla tudo. Deus não é capaz de predizer
o futuro pois o futuro não está completamente sob seu controle. Há mistério
para Deus tanto como para o homem.[7] Deus é, então, cercado de
fatos brutos.[8] Há possibilidade acima de
Deus e o homem.[9] A certeza do conhecimento
de Deus dos eventos futuros é anulada.[10] Dizem que o conhecimento
de Deus se torna dependente de uma realidade temporal que Ele não controla
completamente. Deus tem que esperar a eleição retornar;[11] Deus tem que esperar as
decisões dos homens em muitas questões.[12] Eles dizem que a própria
onisciência de Deus é negada.[13]
Dizem que o
Deus dos arminianos, por essa razão, é um Deus finito,[14] um Deus que é dependente
do homem,[15] um Deus que é
determinado,[16] um Deus que é limitado
pelos fatos da realidade,[17] um Deus que está sujeito
às mesmas condições que o homem.[18] Em outras palavras, se o
livre-arbítrio for atribuído ao homem, então Deus não é mais o Deus soberano da
Bíblia. Esta é a acusação feita contra a doutrina arminiana do livre-arbítrio.
Um breve exame
do ensino positivo do Calvinismo nestas questões podem ser úteis aqui. As
declarações particulares citadas são em sua maioria das obras de Cornelius Van
til. De acordo com o dr. Van Til, o decreto de Deus significa que todo fato e
lei no universo criado é criado e se estende e cumpre o que deve “pela força
do” plano ou propósito de Deus. Deus preordena “tudo que acontece.”[19] A vontade de Deus é o
poder final e exclusivamente determinante de tudo que vem a acontecer. A
natureza de qualquer coisa criada é o que é por causa de um ato de determinação
em relação a ela da parte de Deus.[20]
Sobre o
controle de Deus, o dr. Van Til afirma que tudo, sem restrição, está sob o
controle e direção de Deus. A liberdade criada do homem opera em subordinação à
e de acordo com a vontade última de Deus. A vontade de Deus é última e controla
todas as coisas.[21] Deus é auto-suficiente,
por isso tem controle sobre tudo.[22] A vontade do homem não
pode frustrar qualquer detalhe do plano de Deus.[23] Sobre o conhecimento de
Deus, é dito que, visto que toda a realidade é determinada pela vontade de
Deus, por essa razão, Deus conhece todas as coisas. Deus controla tudo, por
isso conhece tudo.[24] Está na base de seu
próprio decreto a respeito do mundo que Deus conhece o mundo.[25] A presciência de Deus é
baseada em sua preordenação.[26] O conhecimento de Deus é
de si mesmo e de todas as possibilidades além dele.[27] Deus conhece o universo
antes dele existir.[28] Deus conhece o que pode
ocorrer.[29] Não há fatos brutos para
Deus, nenhuma indeterminação, nenhuma contingência, nenhuma probabilidade. Para
Deus há somente realidade absoluta.[30] A onipotência e a
onisciência de Deus são, por essa razão, afirmadas sem restrição.[31]
II. O DECRETO DE DEUS
A queixa
contra a doutrina do livre-arbítrio inclui a acusação de que, de fato, nega que
tudo aquilo que acontece está de acordo com o conselho eterno de Deus. Dizem
que nega que o decreto ou plano de Deus é todo-abrangente. Esta é uma crítica
válida da doutrina do livre-arbítrio? Proponho-me mostrar que não é. Enquanto
afirmo o livre-arbítrio, também afirmo, com o dr. Van Til, que Deus tem um
plano completo para o universo, que todas as coisas acontecem em relação a este
plano, e que não há nenhuma indeterminação para Deus.[32] Concordo que nada
acontece fora da vontade e do plano de Deus.[33] Como pode tal concepção
da soberania absoluta ser defendida junto com a doutrina do livre-arbítrio? Os
parágrafos seguintes tentarão mostrar que os dois não são incompatíveis.
O primeiro e
mais importante ponto a ser notado aqui é que todo-abrangente não significa
necessariamente todo-determinativo. O calvinista diz que o decreto de Deus é
todo-abrangente no sentido de ser todo-determinatvo. Isto é, o decreto de Deus
determina o que quer que vem a ocorrer. A vontade de Deus é o poder final e
exclusivamente determinativo de tudo que acontece.[34] Isto quer dizer que os
atos livres do homem já são determinados pela vontade de Deus; a escolha já foi
feita por Deus; Deus já determinou toda escolha do homem por seu decreto
eterno. A implicação é que, a menos que todo detalhe seja determinado por Deus,
o decreto não seria todo-abrangente. É verdade que todo-abrangente poderia
significar todo-determinativo. Deus certamente seria soberano na base de um
decreto todo-determinativo. Mas o ponto aqui é que todo-abrangente não
necessariamente significa todo-determinativo. Todo detalhe pode ser incluído no
decreto de Deus sem tudo ser determinado ou efetuado por Deus, e Deus não é
menos soberano se o decreto for pensado dessa forma. Deus é ainda absolutamente
soberano na base de um decreto todo-abrangente, embora não todo-determinativo.
Todavia, isto
não é dizer que nada é determinado por Deus. De fato, nada poderia ser mais
determinativo do que o absoluto e soberano ato da criação de Deus. Como o dr.
Van Til diz, todo ser criado é o que é por causa do ato determinativo de Deus
em relação a ele.[35] Assim sendo, pode ser
dito que o homem é o que é por causa do ato determinativo de Deus em relação a
ele. Deus determinou a natureza do homem. Deus foi livre para conceder ao homem
qualquer natureza que escolhesse. Sua escolha foi livre e soberana. Se o homem
tem livre-arbítrio, e eu assim afirmo, é porque Deus soberanamente determinou dessa
forma. Em outras palavras, Deus soberana e absolutamente determinou a liberdade
do homem, mas não os atos livres do homem, pelo menos no mesmo sentido. A razão
de fazer esta classificação será vista mais tarde. O principal a ser notado
aqui é que Deus determinou e criou o livre-arbítrio do homem de tal forma que o
exercício dessa vontade não é determinada. A liberdade do homem, não seus atos
livres, é determinada. Mas ainda, isto é parte do plano de Deus. Esta é a forma
que ele o planejou, o criou. Os atos livres do homem estão incluídos no decreto
de Deus, mas não são determinados por ele. O decreto de Deus é todo-abrangente,
mas não todo-determinativo.
Podemos dizer,
então, que os atos livres do homem não são determinados por Deus em nenhum
sentido? Isto dificilmente parece ser o caso. Por exemplo, dizer que Deus
determinou a liberdade do homem significa que Deus determinou que haverá
escolhas livres. Deus é a causa última de toda livre escolha porque ele é o
único que soberanamente dotou o homem com liberdade. Nesta base Deus é a causa
última dos atos livres no sentido que ele criou a liberdade do que eles
originam; todavia o homem é a causa última no sentido que é ele, não Deus, que
determina se esta ou aquela escolha particular será sim ou não.
Talvez haja um
outro sentido
O decreto simplesmente faz
de Deus o Autor de seres morais livres, eles próprios os autores do pecado.
Deus decreta sustentar a livre agência deles, regular as circunstâncias da sua
vida, e permitir que a livre agência seja exercida numa multidão de atos, dos
quais alguns são pecaminosos. Por boas e santas razões, Ele dá certeza ao
acontecimento desses atos, mas não decreta acionar efetivamente esses maus
desejos ou más escolhas no homem. O decreto concernente ao pecado não é um
decreto efetivo mas permissivo, ou seja, um decreto para permitir o pecado, em
distinção de um decreto para produzir o pecado sendo Deus a sua causa
eficiente.[44]
Nestas
afirmações selecionadas, Berkhof parece estar falando como um arminiano. Obviamente,
ele qualificaria sua posição em outros lugares. Como foi observado, ele diz que
Deus determina tudo que acontece. Todavia, como as declarações acima mostram,
tudo não é determinado no mesmo sentido; e a maneira que ele explica a vontade
permissiva de Deus não está distante da concepção arminiana do livre-arbítrio
do homem.
Dessa forma
pode ser possível que os atos livres do homem sejam determinados no sentido que
os decretos os torna certos sem efetuá-los. O fato do decreto ser
todo-abrangente torna os atos livres certos neste sentido. Assim, pode ser dito
que Deus seja a causa última, o fator determinativo, o agente responsável no
sentido que seu decreto inclui todo ato livre do homem de uma maneira que o
torna certo. Todavia os atos livres são escolhas do homem, não de Deus.
Temos visto
que os atos livres dos homens são determinados por Deus em certos sentidos,
todavia o ponto básico é que no sentido ordinário da palavra determinar, que é
no sentido de precisa e exatamente efetuar de antemão, Deus não determinou os
atos livres do homem. Ef 1.11 é geralmente citado em defesa da alegação de que
Deus determinou tudo que acontece: “[Deus] faz todas as coisas, segundo o
conselho da sua vontade.” Mas isto não necessariamente significa que Deus
determinou todas as coisas segundo o conselho da sua vontade no sentido que
acabou de ser descrito. Pode legitimamente ser interpretado como significando
que tudo que acontece, acontece do modo que Deus planejou. Se o homem tem
livre-arbítrio, este é o modo que Deus planejou. Os atos livres do homem estão
dentro do conselho de Deus; este é o próprio decreto, que o homem devesse ter o
poder de livre escolha. O decreto de Deus pode assim ser todo-abrangente sem
ser todo-determinativo. Isto significa que Deus é menos do que soberano? A
iniciativa foi tirada das mãos de Deus? Deus é limitado, determinado, finito,
dependente? Nem um pouco. A liberdade de Deus para decretar o que quer que lhe
agrada é prova de sua absoluta soberania. Se o decreto inclui o livre-arbítrio
do homem, ou até uma auto-limitação para Deus mesmo, Deus ainda é soberano,
pois ele é livre para decretar o que lhe apraz. Deus é livre para determinar a
vontade do homem se assim escolher, mas se ele decreta suspender seu poder
determinativo com respeito aos atos livres dos homens, é porque ele
soberanamente escolheu assim fazer. Deus é absolutamente soberano em tudo que
faz.
Contrários à
acusação feita contra a posição arminiana, então, podemos afirmar que todos as
coisas acontecem de acordo com o conselho de Deus, embora não afirmamos que
todos as coisas são exclusivamente determinadas por Deus. Ainda, nada é
independente do plano de Deus. Nem a liberdade do homem nem os atos livres
resultantes são independentes de Deus, pois este é o próprio estado das coisas
que Deus decretou.
III. O CONTROLE DE DEUS
Temos afirmado
que a vontade do homem é livre, e que esta própria liberdade é parte do decreto
soberano, todo-abrangente de Deus. O próximo ponto a ser considerado é o
controle de Deus sobre sua criação. A afirmação é feita contra o Arminianismo
que, se tal liberdade última for atribuída à mente humana, então aqui está algo
que Deus não controla. O controle de Deus é incompleto; a vontade do homem
assume uma posição de autonomia e independência contra Deus, e Deus é impotente
diante dela.
A questão que
o arminiano enfrenta, então, é esta: como Deus pode ter controle sobre uma
criatura que tem livre-arbítrio se o próprio Deus, na verdade, não determina as
escolhas feitas por essa vontade? E se Deus não tem controle absoluto, como ele
pode ser soberano? Estas questões podem ser respondidas por uma cuidadosa
consideração de dois pontos separados, a criação absoluta e o soberano decreto
da auto-limitação.
O primeiro e
mais importante ponto é que Deus é o criador absoluto de todas as coisas sem
exceção. O homem é uma criatura, e sua liberdade é criada. Como parte da
criação de Deus, o homem está sob o controle absoluto de Deus. Deus não criou
um Frankenstein. O retrato do calvinista de um homem com livre-arbítrio conforme
expressa o arminiano é um tanto exagerado; é usualmente uma caricatura
grotesca. Como foi mencionado anteriormente, dizem que tal ser com
livre-arbítrio tem poderes originais próximos dos de Deus, tem poderes últimos
mutuamente dependentes de Deus, tem autonomia contra Deus, é auto-suficiente
assim como Deus é auto-suficiente, e é independente do controle de Deus. Mas
estas coisas seriam verdadeiras somente se o homem não fosse um ser criado.
Nada pode ser mutuamente dependente de Deus exceto aquilo que não é criado por
Deus. O homem é auto-suficiente e independente de Deus? Somente se fosse
incriado, o que ele não é. O homem tem autonomia contra o plano de Deus?
Somente se fosse incriado, o que ele não é. A autonomia do homem é uma
autonomia criada que tem seu lugar dentro do plano de Deus, não contra ele. A
medida de causa última na vontade do homem faz o homem mutuamente dependente de
Deus? Somente se o homem fosse incriado, o que ele não é. Deus o criador ainda
é Senhor de sua criação.
Deus controla
todas as coisas, então, no sentido que ele é o criador e sustentador de tudo.
Mas e quanto à vontade do homem? Como pode ser dito que Deus a controla se ele
não determina suas escolhas? A resposta é que Deus não controla a vontade no
sentido de determinar quais escolhas a vontade fará. Deus controla as
circunstâncias externas de um homem pela sua divina providência e trabalha
dentro do coração através do Espírito Santo, mas não ao ponto de deixar o homem
sem escolha. Deus trabalha até ao ponto de abrir e endurecer o coração, todavia
sem inclinar a própria vontade para um ou outro lado e sempre dentro do campo
de Seu pré-conhecimento. Deus controla a própria vida de um homem, de modo que
ele pode impedir qualquer curso de ação que um homem escolhe, alterando as
circunstâncias externas ou até matando-o. Este último pensamento, que Deus pode
matar um homem como meio de exercer controle sobre ele, sugere o fato que o
controle de Deus sobre a vontade é freqüentemente um controle negativo. Deus
pode impedir que o homem faça certas escolhas privando-o de sua vida antes que
ele seja confrontado com a necessidade de escolher. Mas Deus não controla a
vontade do homem no sentido que ele força todas as escolhas a serem feitas. Ele
pode impedir certas escolhas, mas Ele não faz escolhas particulares para os
indivíduos. Por exemplo, Deus pode, por vários meios, impedir que um jovem
homem escolha entrar em um seminário, mas Ele não força ativamente um homem a
entrar em um seminário. Ele pode exercer influência através do Espírito Santo,
através da providência, através de uma abertura real do coração de um homem;
mas a vontade ainda está em poder do homem.
Tenho afirmado
que Deus tem controle absoluto sobre todas as coisas porque ele criou todas as
coisas. Neste sentido Deus tem controle sobre a situação total. Por outro lado,
tenho dito que há um sentido
Alguém dirá
ainda que Deus fica limitado por tal combinação. Se a vontade é livre, Deus não
é confrontado com aquilo que ele não pode controlar? A resposta é não; ele é
confrontado com aquilo que ele não quer controlar. Há uma tremenda diferença
entre “não pode” e “não quer.” E ao dizer que Deus não determina a vontade do
homem, chegamos ao segundo ponto nesta seção, a noção do decreto soberano de
Deus da auto-limitação. A idéia de auto-limitação significa que Deus criou o
homem com a capacidade para fazer suas próprias escolhas e soberanamente
decretou suspender seu próprio controle no reino da vontade do homem. Se Deus é
limitado, é somente pelo ato soberano de uma auto-limitação, uma suspensão
auto-imposta de seu controle neste ponto específico. O homem não limita Deus;
Deus se limita. A auto-limitação é, ela mesma, uma escolha soberana e livre da
parte de Deus; ele não foi forçado de forma alguma a limitar seu controle. O
fato que ele livremente escolheu limitar-se mostra que ele é soberano, que ele
tem controle sobre toda a situação. Desse modo, não é que Deus não pode
controlar a vontade do homem; neste caso Deus não seria soberano. Antes, é o
caso que Deus livremente escolhe não controlar a vontade do homem, e assim
mantém sua soberania absoluta. Deve também ser lembrado que esta soberana
suspensão auto-imposta um dia será abandonada quando Deus se sentar como o juiz
soberano sobre tudo.
O que foi dito
aqui significa isto, que a medida da soberania de Deus não é o que Deus
decretou ou o que Deus criou, mas a absoluta liberdade de Deus para decretar e
criar o que ele deseja. Deus criou o homem com livre-arbítrio pois se agradou
em assim fazer; Deus limitou seu controle sobre esta vontade livre pois se
agradou em assim fazer. Neste caso ou em qualquer outro caso Deus não é menos
do que absolutamente soberano.
IV. O CONHECIMENTO DE DEUS
O ponto final
a ser considerado neste ensaio é a relação do livre-arbítrio com o conhecimento
de Deus. A acusação é que a doutrina do livre-arbítrio necessariamente
significa que há indeterminação, contingência, possibilidade, acaso, mistério,
fato bruto, ou surpresa para Deus. Dizem que o conhecimento de Deus se torna
dependente do homem; e se Deus é dependente do homem em qualquer sentido, ele
não pode ser soberano.
Esta questão
pode ser apresentada imediatamente, então: o livre-arbítrio faz o conhecimento
de Deus dependente do homem? O calvinista responde que sim. A razão é que o
calvinista faz o conhecimento de Deus dependente de seu decreto ou determinação
de todas as coisas. O dr. Van Til diz que toda realidade é exaustivamente
determinada pela vontade de Deus e “por essa razão exaustivamente conhecida
pela mente de Deus.”[45] Ele enfatiza a idéia que
“Deus controla e por isso conhece todas as coisas.”[46] Novamente, “é na base de
seu próprio decreto com respeito ao mundo que Deus tem completo conhecimento do
mundo.”[47] Berkhof diz que o problema
do conhecimento de Deus é resolvido pela consideração que Deus decretou todas
as coisas junto com suas causas e condições na exata ordem em que elas
acontecem; assim o conhecimento de Deus das coisas futuras e dos eventos
contingentes repousa em seu decreto.[48] O conhecimento de Deus é
“baseado em Sua determinação.”[49] Visto que tornam o
pré-conhecimento dependente da preordenação de Deus, não é de se admirar que o
calvinista diz que, se Deus não determinar a vontade, então ele não pode saber
o que a vontade do homem escolherá até que a escolha seja feita. Berkhof diz, “Podemos
entender como Deus pode ter conhecimento prévio onde a necessidade domina, mas
achamos difícil conceber um conhecimento prévio de ações que o homem origina
livremente.”[50] Ele diz que “ao que
parece, é impossível conhecer antecipadamente eventos que dependem por completo
da decisão causal de uma vontade alheia a princípios que podem em qualquer
ocasião, independentemente do estado de espírito, das condições existentes, e
dos motivos que se apresentam à mente, seguir diferentes direções. Eventos
dessa natureza só podem ser conhecidos previamente como puras possibilidades.”[51] Este exagero grosseiro,
junto com outras declarações citadas acima, são suficientes para mostrar que,
para o calvinista, a preordenação de Deus não é somente uma causa suficiente
mas também necessária do pré-conhecimento de Deus.
Duas coisas
podem ser ditas
Nem é este
conhecimento dependente do homem de qualquer forma. A fim de ser chamado
dependente, o conhecimento teria que ser, verdadeiramente, conhecimento post-eventum. Mas ele não
é. Deus conhece os atos livres dos homens mesmo antes do mundo ter sido criado,
enquanto o universo existia somente como uma idéia ou plano na mente de Deus.
Como alguém, então, pode dizer que o conhecimento de Deus depende de qualquer
coisa, se ele está completo em sua própria mente antes de qualquer coisa
existir? O conhecimento de Deus é, então, completamente independente e
absolutamente todo-abrangente. O livre-arbítrio do homem não altera isto nem um
pouco. Deus ainda não é menos do que absolutamente soberano.
CONCLUSÃO
A questão sob
consideração neste ensaio foi se a doutrina do livre-arbítrio torna Deus menos
do que absolutamente soberano. Contra a acusação calvinista de que ela torna,
busquei mostrar que não. O fato que o decreto de Deus é todo-abrangente,
incluindo tanto a liberdade do homem como seus atos livres, é suficiente para
manter a soberania de Deus com respeito ao seu decreto. O fato que o controle
de Deus é absoluto no sentido que ele é o criador de tudo, e que a limitação
com respeito à vontade do homem é auto-imposta, também mostra que Deus é
soberano. Que o conhecimento de Deus dos atos livres do homem é tanto completo
quanto independente também significa que Deus é soberano.
O propósito
deste ensaio foi provar que o homem tem livre-arbítrio e que Deus é soberano. O
propósito foi mostrar que o livre-arbítrio e a soberania não são incompatíveis,
como os críticos da doutrina do livre-arbítrio parecem sugerir. Esforço tem
sido feito para mostrar que o livre-arbítrio, a priori, não impede a absoluta
soberania de Deus. Tal discussão é necessariamente limitada, e as conclusões
alcançadas não são, de forma alguma, a palavra final. A última resposta deve
vir da revelação das Escrituras. Somente lá podemos aprender se o homem na
verdade tem livre-arbítrio, e se Deus na verdade é o Senhor Soberano.
Tradução: Paulo Cesar
Antunes
[1] Cornelius Van Til, Christian Theistic
Evidences (CTE), class syllabus 1961, p. 36.
[2] Van Til, Apologetics (AP.), class
syllabus, 1959, p. 91.
[3] Van Til, An Introduction to Systematic
Theology (ST), class syllabus, 1961, p. 187.
[4] CTE, p. 36.
[5] ST, p. 16.
[6] ST, p. 160.
[7] ST, p. 183.
[8] AP, pp. 89, 91.
[9] Van Til, A Christian Theory of Knowledge
(CTK), class syllabus, 1957, p. 2.
[10] Louis Berkhof, Systematic Theology
(London: The Banner of Truth Trust, n.d.), p. 68.[11] AP, p. 70.
[12] AP, p. 89.
[13]Berkhof, p. 68.
[14] CTE, p. 36.
[15] ST, p. 160; AP, p.21.
[16] AP, p. 91.
[17] Ibid.
[18] CTK, p. 2.
[19] CTE, p. 55.
[20] AP, p. 11.
[21] ST, p. 175.
[22] CTK, p. 1.
[23] AP, p. 12.
[24] ST, pp. 180, 183.
[25] ST, p. 236.
[26]Berkhof, p. 107.
[27] ST, p. 107.
[28] ST, p. 235.
[29] Ibid., p. 67.
[30] CTE, pp. 55, 58, 59, 60.
[31] ST, p. 175.
[32] CTE, p. 58.
[33] ST, p. 175.
[34] AP, p. 11.
[35] Ibid.
[36]Berkhof, p. 100.
[37]Berkhof, p. 100.
[38]Berkhof, p. 103.
[39]Berkhof, p. 77.
[40]Berkhof, p. 79.
[41]Berkhof, p. 103.
[42]Berkhof, p. 104.
[43]Berkhof, p. 105.
[44]Berkhof, p. 108.
[45] ST, p. 180.
[46] ST, p. 183.
[47] ST, p. 236.
[48]Berkhof, pp. 67-8.
[49]Berkhof, p. 107.
[50]Berkhof, p. 67.
[51]Berkhof, p. 107
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