quarta-feira, 28 de julho de 2021

A Abordagem Clássica-Teológica para a Perseverança e Apostasia: G. C. Berkouwer

 

B. J. Oropeza

 

Durante a segunda metade do século 20, G. C. Berkouwer fez uma contribuição teológica na área da apostasia e perseverança com sua obra intitulada  Faith and Perseverance  (1958). Berkouwer combina as primeiras   confissões protestantes com a Escritura para chegar à sua percepção da perseverança. Ele sugere que as passagens que parecem contrárias à doutrina da perseverança são meios que Deus usa para levar os santos a confiar em Deus.[1]  A obediência é, portanto, um fator importante. Todavia, as passagens que parecem alertar contra o perigo de apostasia não exaurem a realidade da graça de Deus.[2]  A perseverança, que é efetuada no crente através da oração, pregação e sacramentos, pode somente ser mantida em fé através da graça de Deus. Dessa forma, a perseverança é um dom que é selado pela fé. Os cristãos perseveram quando deixam de confiar em si mesmos e descansam na graça perseverante de Deus.[3]  Berkouwer conclui, “Quando os pais reformados falaram sobre a consolação da perseverança, eles tinham a graça de Deus em mente. Por essa razão, a doutrina da perseverança, na medida em que ela reconhece sua dependência da graça, nunca pode ser uma mera abstração que torna uma continuidade de vida sem resultados”.[4]

 

O argumento de Berkouwer que as admoestações bíblicas são meios pelos quais Deus realiza a perseverança não é nada novo.[5]  Este ponto de vista não é livre de fraquezas. Se os eleitos não fossem admoestados, eles então seriam capazes de apostatar-se? Se não, qual é exatamente a distinção ou importância especial que o tema da advertência tem no Novo Testamento? Devemos supor que, juntamente com a graça, as advertências são necessariamente eficazes aos eleitos, mas não aos não-eleitos? Mesmo se supormos que isto é concebível, em vista de outras opções, ela é a mais provável? Isto é, se Berkouwer desvencilhar-se de suas pressuposições reformadas, ele teria honestamente chegado às mesmas conclusões? Sua perspectiva carece de evidência dos próprios autores do Novo Testamento. Será que  eles  acreditavam que ouvir ou ler suas advertências operava ou causava a perseverança eficaz entre os eleitos? Se formos examinar as passagens de advertências à luz de seus respectivos contextos, não consideraríamos uma melhor opção afirmar que pelo menos alguns dos escritores supunham que seus leitores fossem crentes genuínos que estavam em sério perigo de apostasia? Parece que a interpretação de Berkouwer é oferecida mais na tentativa de  preservar o sistema reformado  do que ser inteiramente fiel ao pleno efeito das passagens de advertências.

 

Berkouwer começa seu estudo citando as confissões reformadas antes de seguir para a Escritura.[6]  Não é nenhuma surpresa, então, que ele classifica a perseverança sob a categoria da graça e não examina cuidadosamente as passagens que podem estar associadas à apostasia. Doutrinas centrais às confissões reformadas tornam-se a pressuposição com a qual todas as passagens bíblicas devem conformar-se. Por outro lado, um outro método teológico não faz melhor se começar com passagens que podem estar relacionadas à apostasia, mas então insere neste um sistema que interpreta mal as passagens sobre a perseverança, eleição e predestinação. Se teólogos sistemáticos mitigam a doutrina da apostasia por meio da eleição, ou a eleição por meio da apostasia, sua abordagem frequentemente torna-se pouco mais do que uma repetição dos velhos dogmas calvinistas ou arminianos com, talvez, o benefício adicional de adotar e sistematizar passagens bíblicas que foram interpretadas através da exegese tradicional-apostólica.[7]

 

O que falta em Berkouwer e outras obras teológicas é a análise de passagens à luz de seu ambiente sócio-histórico, cultural e retórico. Deve-se tentar entender o que um tema bíblico significava aos destinatários originais. Uma base inicial falha inevitavelmente leva a uma trajetória falha. As suposições de Berkouwer convencem apenas aqueles que compartilham de suas opiniões reformadas. Aos de fora, seus argumentos soam como casos de argumentação tendenciosa. Um outro problema relacionado é que a sistematização de passagens tem a tendência de fazer Paulo, João, os textos sinóticos e outros escritores ou escritos do Novo Testamento afirmarem essencialmente a mesma coisa, sem apresentar qualquer real diversidade sobre as questões da perseverança e apostasia.

 

Fonte:  Paul and apostasy: eschatology, perseverance, and falling away in the Corinthian congregation, 22, 23

 

Tradução: Paulo Cesar Antunes


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[1]  BERKOUWER (1958), 97-121.

[2]  Berkouwer escreve, “Se algo é certo é isto, que de acordo com as Escritura, a graça de Deus não cessa diante dos limites da liberdade de escolha humana” (1958:90).

[3]  BERKOUWER, 234-36 cf. 106, 213.

[4]  BERKOUWER, 238.

[5]  Cf. DODDRIDGE (1802-06) antes da época de Berkhouwer e SCHREINER (1998) posteriormente.

[6]  BERKOUWER, 19.

[7]  A visão de Berkouwer parcialmente motivou a obra de Shank (1961), uma resposta wesleyana-arminiana para a perseverança e apostasia (1961:165-78). A obra de Sellers (1987), que defende a visão calvinista, é, por sua vez, uma resposta a Shank.

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