terça-feira, 3 de agosto de 2021

O perigo da sistematização teológica


Esse modo de entender e de empregar a teologia tem também seus perigos. O mais importante disto está em que de tal modo queiramos sistematizar e classificá-lo, que damos a nosso sistema uma autoridade que não deve ter. Esse foi o grande perigo da teologia no século XIX, contra o qual um teólogo luterano dinamarquês, Soren Kierkegaard, insistiu que o ser humano existente, pelo fato de existir, quer dizer, de estar no tempo e no espaço, não pode jamais sistematizar toda a realidade. Disse ele: “Queres dizer que não há tal sistema? De modo algum. Toda a realidade é um sistema, para Deus; mas nunca para nós”. Vemos um exemplo disso no modo em que o teólogo calvinista Jerônimo Zanchi, no fim doséculo XVI, tentou provar a doutrina da predestinação. Segundo Zanchi, visto que Deus é onipotente e onisciente - quer dizer, pode tudo e sabe tudo - Deus sabe e determina tudo o que há de acontecer, e não existe tal coisa como liberdade humana. O que Zanchi fez com tal argumento é pretender que Deus tem que se ajustar a nossa compreensão da onisciência e da onipotência. Mas o certo é que, se Deus é de verdade onipotente, Ele não tem o porquê de se ajustar aos argumentos de Zanchi nem de qualquer outro teólogo. Se Deus é verdadeiramente onisciente, saberá como permitir que exista a liberdade humana, ainda quando o “sistema” de Zanchi não dê lugar a ela. Outro perigo da sistematização excessiva da teologia é que a mensagem e a obra de Deus parecem reduzir-se aos três ou quatro pontos do sistema. Isso acontece, por exemplo, quando reduzimos a mensagem da Bíblia a um “plano de salvação” em três, quatro, ou doze pontos; e parece que basta conhecer esses pontos, de tal modo que a Bíblia fica sobrando.


Fonte:

GONZALEZ, Justo L.; PÉREZ, Zaida M.; Introdução á Teologia Cristã. (Tradução Silvana Perrella Brito). Santo André, SP: Editora Academia Cristã, 2006. 

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