Roger E. Olson
Muitos
(não todos) calvinistas argumentam que o livre-arbítrio libertário, ou poder de
escolha contrária, é um conceito incoerente (p. e., Jonathan Edwards, Loraine
Boettner, R. C. Sproul, John Frame, John Piper e outros). A razão é, eles
argumentam, que ele equivale a crer em efeitos não causados. Eles argumentam
que pessoas agem de acordo com seu motivo mais forte.
O
que eu frequentemente me pergunto é se os calvinistas que argumentam assim creem
que Deus tem poder de escolha contrária. Se Deus tem poder de escolha
contrária, então não pode ser um conceito exatamente incoerente. Mas dizer que
Deus NÃO tem poder de escolha contrária parece tornar Deus prisioneiro da
criação. Sem poder de escolha contrária, a decisão de Deus de criar seria
necessária e isso tornaria a criação menos do que graciosa e, de fato, uma
parte da própria vida de Deus – não um ato livre como se Deus pudesse ter feito
de outra forma.
A
maneira que Jonathan Edwards tentou se esquivar disto em The Freedom of the
Will foi dizer que Deus sempre faz a coisa mais sábia. Calvinistas
contemporâneos que o seguem de perto concordam. Em outras palavras, de acordo
com Edwards, Deus poderia ter feito outra coisa além de criar o mundo, mas ele
criou o mundo porque era o “mais adequado” a fazer.
Minha
pergunta é como isto contorna o problema. Para mim, parece como uma evasiva;
isto é, parece tentar responder o desafio sem respondê-lo. Parece como dizer,
ambos ao mesmo tempo, que Deus poderia não ter criado e que Deus não poderia
não ter criado.
A
pergunta é simplesmente esta: É logicamente concebível que Deus pudesse não ter
criado o mundo? É concebível que Deus pudesse ter decidido contra esta ou
qualquer criação?
A
resposta de Edwards parece dizer sim e não ao mesmo tempo. Isto vai contra as
leis da lógica, A NÃO SER que ele possa explicar como o “sim” e o “não” se
referem a coisas diferentes. Mas em sua explicação, eles não se referem.
A
pergunta é: Deus é prisioneiro de sua própria sabedoria (ou de qualquer coisa)?
Eu anteriormente discuti aqui a questão do nominalismo/voluntarismo versus o
realismo – isto é, se Deus tem uma natureza. Mas até mesmo os realistas mais
estritos não creem que Deus é prisioneiro de seu caráter eterno. Antes, seu
caráter eterno guia suas decisões; ele não necessariamente as governa.
SE
alguém diz que Deus “sempre faz a coisa mais sábia” COM A SUPOSIÇÃO de que há
sempre somente UMA “coisa mais sábia”, então como alguém não está tornando a
criação necessária e, portanto, não graciosa? (Um princípio básico da teologia
é que o que é por natureza não pode ser por graça. Se eu TENHO que resgatar
você, não é um ato de misericórdia ou graça.)
Por
que supor que há sempre somente UMA “coisa sábia” a ser feita – até mesmo para
Deus? Por que não poderia ter sido sábio criar, mas também sábio não criar?
Obviamente, como qualquer racionalista irá querer saber, então por que Deus
criou? Isto foi simplesmente uma escolha arbitrária – como lançar dados?
Aqui
eu sou tentado a devolver ao calvinista seu próprio argumento que a escolha de
Deus de alguns para salvar e de outros para condenar não é arbitrária sem
qualquer palpite do que poderia explicá-la. Em outras palavras, se é justo ao
calvinista argumentar que a seleção divina não é baseada em algo que Deus “vê”
nos eleitos ou nos condenados (que os diferencia) e todavia não é arbitrária,
por que a pessoa que crê no poder de escolha contrária de Deus não poderia
argumentar que a escolha de Deus para criar não é arbitrária, ainda que não
possa ser dada nenhuma razão específica para ela?
Entretanto,
eu prefiro argumentar que para Deus, como para nós, há momentos em que duas
opções alternativas são igualmente sábias e nenhum fator controlador,
determinante, interior (tal como motivo) ou de outra forma determina que opção
alguém deve escolher ser correta.
Por
exemplo, alguns casais enfrentam a escolha de se ou não ter um filho. Conheço
casais assim. Eles lutaram com a decisão, pensaram nela longa e dificultosamente,
e eles nunca realmente chegaram a uma razão determinativa para ter ou não ter
um filho. Alguns desses casais decidem ter um filho, o que é sábio, e alguns
decidem não ter, o que pode também ser sábio.
Me
parece que dizer “Deus sempre faz a coisa mais sábia”, com isso querendo dizer
que Deus deve fazer assim e assado (p. e., criar o mundo), é o mesmo que dizer
que Deus é uma máquina e que a criação e a redenção do mundo não são por graça,
mas por natureza. Somente se Deus realmente poderia ter feito diferentemente do
que criar é que a criação pode ser por graça somente. A graça não pode ser
compelida e ainda ser graça.
A
conclusão é, obviamente, que SE a criação e a redenção do mundo por Deus é
verdadeiramente graciosa e não automática, então Deus deve possuir
livre-arbítrio libertário ou poder de escolha contrária. E se Deus possui, ele
não pode ser um conceito incoerente.
Agora,
é outra coisa completamente diferente argumentar que Deus possui poder de
escolha contrária, mas os humanos não possuem. Esse é um argumento diferente. A
resposta natural é “Por quê?” Se Deus o possui, por que ele não poderia dá-lo
aos humanos? Não parece haver nada com o poder de escolha contrária que exige
deidade. Não é como a onipotência, por exemplo.
Penso
que Edwards ladeou a questão e da mesma forma fazem seus seguidores que repetem
seu argumento de uma forma ou de outra. Dizer “Deus sempre faz a coisa mais
sábia” é ou sugerir que Deus é um autômato, sendo que nesse caso a criação e a
redenção são automáticas e não graciosas, ou sugerir que Deus PODERIA fazer
aquilo que é algo diferente do que “a coisa mais sábia”.
Eu
rejeito a noção que “Deus sempre faz a coisa mais sábia”, não porque eu penso
que Deus é algo menos do que absolutamente sábio, mas porque eu não creio que
sempre há somente uma “coisa mais sábia” em toda situação de escolha entre
opções. Para evitar tornar a criação e a redenção diferentes de graciosas, nós
temos que supor que Deus realmente poderia ter escolhido não criar. Dizer “Deus
sempre faz a coisa mais sábia” é sugerir que Deus realmente não poderia ter
feito de outra forma.
Dessa
forma, o argumento calvinista de que o livre-arbítrio libertário, poder de
escolha contrária, é um conceito incoerente cai sobre sua própria espada, A NÃO
SER QUE o calvinista esteja disposto a tornar Deus prisioneiro de sua
sabedoria, isto é, de sua natureza, de tal forma que a criação e a redenção não
são graciosas.
Tradução:
Paulo Cesar Antunes
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