O chamado ao arrependimento nem sempre resulta em salvação.
“Porque muitos são chamados, mas poucos escolhidos” (Mt 22.14). Ainda assim, o
evangelho deve ser pregado a todas as nações antes do fim dos tempos (24.14).
Os discípulos de Jesus são comissionados a fazer “discípulos de todas as nações”
(28.19), todavia é reconhecido que muitas pessoas irão ao Geena (25.31-46). A
única coisa certa é que o chamado é para todos, mas nem todos serão salvos.
O chamado tem um lugar especial na teologia de Paulo. Uma passagem
apocalíptica distinguia entre aqueles que “padecerão eterna perdição, ante a
face do Senhor e a glória do seu poder” e aqueles por quem ele orou para que
Deus tornasse “dignos da sua vocação,” todavia não há uma palavra sobre a dupla
predestinação. Os “dignos da sua vocação” claramente são “todos os que creem (porquanto o nosso testemunho foi crido entre vós)” (2Ts 1.9-11).
Os chamados em Coríntios parecem idênticos aos santos que creram,
mas procuramos em vão por alguma sugestão de que há um chamado irresistível
(1Co 1.1, 2, 24, 26). Há muitas situações na vida nas quais o chamado é para
servir ao Senhor, mas o chamado para servir é o mesmo que o chamado para ser
salvo (7.20-22). É uma distorção do evangelho ensinar que todos são chamados
para ser salvos mas somente alguns para servir. Os chamados são aqueles que
ouviram e creram, mas não há nenhuma sugestão de que alguns que ouviram foram
predestinados à incredulidade de uma forma predeterminada.
O carro-chefe do Calvinismo com sua doutrina de um chamado
irresistível tem sido a carta de Paulo a Roma. A primeira referência aos
chamados é muito semelhante àquelas já observadas em Corinto (1.1, 6), mas duas
passagens requerem análise especial. Rm 8.28 diz que Deus “coopera para o bem
daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito” (New English Bible), todavia
por séculos a Versão King
James de 1611 tem sido seguida, que diz que “todas as coisas
contribuem juntamente para o bem,” como se a cooperação humana fosse excluída
do propósito de Deus. A cooperação humana da fé, esperança e amor tem sido
atacada como sinergismo,
todavia Paulo usa o verbo grego synergei!
Então, Rm 8.29f é interpretado como se a predestinação, o pré-conhecimento, o
chamado, a justificação e a glorificação fossem uma cadeia dourada de causa e
efeito, no entanto Paulo deixa muito claro que os que foram conhecidos por Deus
podem regressar ao estado de escravidão do qual vieram (Gl 4.8-11).
A última e desesperada defesa do determinismo está em Rm 11.29,
onde a Revised Standard
Version diz que “os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis”.
Aqui a Versão King James é
preferível quando diz que “os dons e a vocação de Deus são sem arrependimento,”
pois o grego ametameleta significa
“não arrependido”. O ponto é que Deus não modificou sua aliança com Israel e
transferiu todas as suas promessas à igreja, uma opinião defendida pelo
Calvinismo conservador. Deus tem um propósito tanto em Israel como entre os
gentios, mas seu plano inclui a resposta humana da fé antes dele poder ser
completado. Quando a paciência de Deus é relacionada a um correto entendimento
da doutrina da predestinação de Paulo, o refúgio calvinista do determinismo vem
abaixo. A responsabilidade humana dificilmente pode ser mais exagerada do que
na própria declaração de Paulo sobre como a paciência de Deus busca levar as
pessoas ao arrependimento. Rm 2.4-10 não requer nenhuma ideia estranha a fim de
se tornar clara. É citado integralmente no próximo parágrafo.
Ou desprezas tu as riquezas
da sua benignidade, e paciência e longanimidade, ignorando que a benignidade de
Deus te leva ao arrependimento? Mas, segundo a tua dureza e teu coração
impenitente, entesouras ira para ti no dia da ira e da manifestação do juízo de
Deus; o qual recompensará cada um segundo as suas obras; a saber: a vida eterna
aos que, com perseverança em fazer bem, procuram glória, honra e incorrupção;
mas a indignação e a ira aos que são contenciosos, desobedientes à verdade e
obedientes à iniquidade; tribulação e angústia sobre toda a alma do
homem que faz o mal; primeiramente do judeu e também do grego; glória, porém, e
honra e paz a qualquer que pratica o bem; primeiramente ao judeu e também ao
grego.
A seção subsequente sobre salvação e predestinação continuará a
discussão sobre paciência e predestinação no propósito de Deus em Rm 9.22. Rm
2.4-10; 8.28-30; 9.22; 11.29 devem ser lidos como uma unidade.
É bastante instrutivo observar que Paulo ensina Timóteo a usar o
tipo de paciência pastoral que o próprio Deus usa para trazer as pessoas ao
arrependimento (2Tm 2.24-26). Isto dificilmente é paciência irresistível, pois
há o perigo de que até mesmo um bispo recém convertido tenha o mesmo destino
que o diabo (1Tm 3.6f). Sem dúvida alguns dos dramas medievais estavam corretos
quando retratavam alguns pomposos bispos! Prelados orgulhosos e professores da
atualidade não estão além desta possibilidade. Até o apóstolo Paulo não pensava
que estava (1Co 9.27).
O chamado de Deus é para cima e para frente, em direção ao prêmio,
mas Paulo sentia que, apesar das dificuldades, tinha que se esforçar. Paulo
suplicou aos seus leitores a viverem de uma maneira digna do chamado com que
tinha sido chamados (Ef 4.1). Isto deve ser baseado nas crenças que unificam,
uma das quais é “uma só esperança da vossa vocação” com que eles foram chamados
(4.4). Deus “nos salvou, e chamou com uma santa vocação,” mais isto não exclui
a possibilidade de que alguns possam abandonar o chamado (2Tm 1.9, 15).
Os crentes hebreus a quem a carta de Hebreus é escrita eram
“irmãos santos, participantes da vocação celestial” (3.1), como também
“participantes do Espírito Santo” (6.4), todavia havia a possibilidade de que
os imaturos entre eles cometessem apostasia (2.1-4; 3.12-14; 5.11-6.20;
10.26-31; 12.12-17).
Se alguém não esquecer que foi limpo de seus antigos pecados e
ficar cego espiritualmente, ele deve confirmar seu chamado e eleição pelo
crescimento na graça (2Pe 1.5-11). Se fizer seu chamado e eleição firmes em
maturidade cristã, ele nunca abandonará o caminho da verdade e da justiça
(1.10; 2.2, 21).
Reconhecer que somos “chamados para a comunhão de seu Filho Jesus
Cristo nosso Senhor” (1Co 1.9) não exige a conclusão que outros não podiam
responder ao chamado. O esforço para confinar 2Pe 3.9 aos eleitos apenas requer
uma exegese que não é óbvia. Conforme essa interpretação restritiva, Deus seria
paciente somente com os eleitos e não desejaria que alguns dos eleitos
perecesse. Ao contrário, parece que Deus é paciente com todas as pessoas
enquanto chama cada uma e todas ao arrependimento.
Quando o chamado é considerado nas páginas do Novo Testamento,
livre dos credos do Calvinismo, não há necessidade de distinções refinadas
entre um chamado externo na revelação geral e a pregação do Evangelho em um
“chamado eficaz, irresistível.”
Há somente um chamado de Deus na revelação geral e na pregação da
revelação especial na Escritura, e sempre que o homem ouvir o chamado, ele pode
tornar-se eficaz quando houver a resposta de arrependimento e fé (At 20.21).
Fonte: The
Word of Truth, 313-316
Tradução: Paulo Cesar Antunes
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