Por Douglas Groothuis
Em seu livro popular A New Kind of Christian, que se tornou o primeiro de uma trilogia, Brian McLaren defende o pós-modernismo como o único caminho a ser seguido pelo evangelicalismo modernista irrelevante e sem influência. McLaren cria uma estória na qual Dan, um cristão desiludido que considera deixar o pastorado, é fortalecido na fé por meio de sua interação bem ativa com Neo, o protagonista proativo e cativante do pós-modernismo.[4] Em uma conversa significativa, Neo diz a Dan que:
As velhas noções de verdade e conhecimento estão sendo, hmm, eu diria, “desconstruídas”, mas não precisamos utilizar todo esse vocabulário. As velhas noções estão sendo questionadas. Novos entendimentos sobre a verdade e o conhecimento que podem potencializá-los ainda não foram totalmente desenvolvidos. Então, Dan, não estou dizendo de forma alguma que a verdade não é importante. Mas estou dizendo que a verdade significa mais do que precisão factual. Significa estar em sincronia com Deus.[5]
A medida que Neo afirma que a verdade é “mais do que precisão factual”, o restante do livro passa a questionar se a verdade tem alguma relação com a precisão factual. Neo descreve a modernidade – o bicho-papão – como “uma era em que as pessoas aspiravam a objetividade absoluta, que acreditávamos que poderíamos produzir certeza e conhecimento absolutos” às custas da poesia, da narrativa, da religião e das artes. Segundo ele, essa era também “uma era crítica”. Se você acredita na “verdade absoluta e objetiva, e está convicto com absoluta certeza, então está claro que você deve refutar qualquer pessoa que creia e entenda diferente de você”.[6] Neo acredita que os evangélicos assumiram uma visão de mundo da modernidade (apesar das críticas do modernismo/iluminismo à religião) na medida em que enfatizam a verdade objetiva, absoluta e cognoscível e a necessidade de refutar aqueles que discordam da verdade. Essa ressaca modernista, segundo Neo, deve ser veementemente rejeitada.
A “desconstrução” pós-moderna da verdade objetiva e da racionalidade, sobre a qual Neo não delineou diretamente, resume-se a isto: a verdade não se aloja em afirmações que correspondem à realidade. Essa noção modernista precisa ser desconstruída ou reduzida a seus elementos “verdadeiros”. A verdade é apenas uma questão de perspectiva; é algo que os indivíduos e as comunidades constroem, principalmente por meio da linguagem.
Se essa visão pós-modernista for aceita, a verdade objetiva é descartada em princípio. A verdade se dissolve em comunidades, grupos étnicos, gêneros e outros fatores contingentes. Nenhuma “metanarrativa” (ou visão de mundo) pode corretamente reivindicar ser um relato verdadeiro e racional da realidade. Isso seria arrogante e impossível.
Uma vez que McLaren já diluiu a noção de verdade, ele agora deve redefinir a natureza da Escritura para que ela se adeque a essas concepções. Os liberais mais antigos sustentavam uma visão de correspondência clássica da verdade e afirmavam que muitas declarações bíblicas - particularmente as afirmações de verdade relacionadas à história e à ciência - falhavam em corresponder à realidade.[7] Por outro lado, os cristãos que são atraídos pelo pós-modernismo mudam o próprio conceito de verdade e então aplicam este novo conceito de verdade às Escrituras. A Bíblia é assim aliviada da pressão de conformar-se exaustivamente a uma realidade objetiva em comparação com a realidade fora de seu próprio conteúdo e com a realidade das perspectivas de seus leitores. A Bíblia agora é “verdadeira” no sentido de que ela é considerada significativa pela comunidade crente, por nos dar grandes narrativas e por nos inspirar espiritualmente. Estar em acordo perfeito com o fato não é mais um problema. Perceber isso, para McLaren e aqueles que ele representa, significa se tornar “um novo tipo de cristão”.
Em sua pesquisa com “os evangélicos mais jovens”, Robert Webber aborda os pontos de vista dos jovens sobre a apologética. Os jovens que foram entrevistados por Webber apresentaram alguma desconfiança do fato da verdade cristã ser vista como objetiva, proposicional e defensável por meio de uma defesa racional convincente.[8] Webber cita três proposições-chave da magnum opus de Carl F. H. Henry, em seis volumes, chamada Deus, Revelação e Autoridade e informa resumidamente que os evangélicos mais jovens – a vanguarda do movimento, na opinião de Webber, simplesmente não têm esse foco. Estas são as declarações que ele cita:
(1) A revelação de Deus é uma comunicação racional transmitida por meio de ideias inteligíveis e palavras significativas, isto é, forma verbal conceitual.
(2) A Bíblia é o reservatório e canal da verdade divina.
(3) O Espírito Santo dirige e supervisiona a comunicação da revelação divina, primeiro, inspirando os escritos apostólicos proféticos e, segundo, iluminando e interpretando a Palavra de Deus dada nas escrituras.[9]
Webber concorda com a rejeição desses jovens progressistas de uma compreensão fortemente proposicional da verdade cristã. A velha visão da verdade deve desaparecer.
Alguns acham que a verdade já está se extinguindo e lamentam seu desaparecimento. O pesquisador americano George Barna relatou que apenas 9% dos “cristãos nascidos de novo” possuem uma cosmovisão bíblica. Ele define tal visão de mundo da seguinte maneira:
Uma cosmovisão bíblica foi definida como: acreditar que existem verdades morais absolutas; que tal verdade é definida pela Bíblia; e uma crença firme em seis pontos de vista religiosos específicos. Esses pontos de vista eram: que Jesus Cristo viveu uma vida sem pecado; Deus é o Criador onipotente e onisciente do universo e Ele ainda o governa hoje; a salvação é um dom de Deus e não pode ser conquistada por esforços humanos; Satanás é real; um cristão tem a responsabilidade de compartilhar sua fé em Cristo com outras pessoas; e a Bíblia é precisa em todos os seus ensinamentos.[10]
Barna relata ainda que “entre as cosmovisões alternativas mais prevalentes estava o pós-modernismo, que parecia ser a perspectiva dominante entre as duas gerações mais jovens (ou seja, Busters [26 a 44 anos] e Mosaics [18 a 25 anos]).”[11]
Em uma nota mais acadêmica, na obra Beyond Foundationalism: Shaping Theology in a Postmodern Context, Stanley Grenz e John Franke se apropriam de ideias da sociologia descritiva de Peter Berger e Thomas Luckmann para explicar o conceito de verdade de Grenz e Franke. Dentro da disciplina da sociologia do conhecimento, Berger e Luckmann escrevem sobre a “construção social da realidade” por meio da linguagem. Berger e Luckmann não fazem afirmações filosóficas sobre a natureza da verdade, mas descrevem como as crenças são formadas e como funcionam em vários contextos sociais. Estritamente falando, a sociologia do conhecimento não é sobre o conhecimento no sentido filosófico (ou seja, crença verdadeira justificada), mas apenas sobre como as crenças ganham plausibilidade em vários ambientes culturais.[12]
No entanto, Grenz e Franke pegam essa noção de construção da realidade por meio da linguagem e a adotam para fins teológicos. Embora admitam que existe um “dado ao universo à parte da tarefa linguística construtiva humana” (até mesmo o especialista pós-modernista Richard Rorty admite isso), eles não consideram a linguagem como correta ou incorreta relacionada a uma realidade objetiva. Antes, eles fazem uma declaração bastante notável: “O simples fato é que não habitamos o 'mundo em si'; em vez disso, vivemos em um mundo linguístico de nossa própria criação.”[13] (Se assim fosse, não haveria precisamente “fatos simples”). Além disso, eles afirmam que não há “objetividade”, entendida como “uma realidade estática existente fora de, e contemporânea com a nossa realidade construída social e linguisticamente; a objetividade não é algo que alguns podem chamar de 'o mundo como ele é'”.[14] Em vez disso, a “objetividade” diz respeito apenas ao que Deus eventualmente trará no futuro, escatologicamente.[15] Grenz e Franke, portanto, negam que a linguagem possa se conectar verdadeiramente com uma realidade extralinguística fora de si mesma – o mundo objetivo como ele é agora. Este é um afastamento significativo e importante da visão de correspondência da verdade e de qualquer tipo de realismo teológico (a alegação de que declarações teológicas em harmonia com as Escrituras refletem uma realidade objetiva).
Este capítulo defende um conceito de verdade que é desafiado por aqueles que trilham o caminho pós-moderno, afastando-se da verdade objetiva. Defendemos uma visão da verdade tanto antiga quanto logicamente convincente. No entanto, muitos evangélicos estão deixando esse entendimento de lado com pouco engajamento crítico. Na pior das hipóteses, alguns evangélicos parecem abandonar – ou pelo menos marginalizar – sua venerável visão da verdade simplesmente porque muitas pessoas pós-modernas a estão questionando ou abandonando.
Notas
[4] Os pensadores pós-modernos Stanley Grenz, Leonard Sweet e Nancey Murphy são todos mencionados favoravelmente nas notas de rodapé.
[5] Brian McLaren, _A New Kind of Christian_ (San Francisco: Jossey-Bass, 2001), p. 61.
[6] Ibid., p. 17.
[7] Para uma crítica clássica do antigo liberalismo teológico, ver J. Gresham Machen, _Christianity and Liberalism_ (Grand Rapids: Eerdmans, 1923).
[8] Eu me pergunto sobre a adequação da amostra de Webber. Conheço muitos evangélicos mais jovens que mantêm uma forte visão objetiva da verdade e da necessidade de uma apologética racional. Isso é verdade para quase todos os alunos de pós-graduação em filosofia da religião do Seminário de Denver que conheço desde 1993.
[9] Robert Webber, _The Younger Evangelicals_ (Grand Rapids: Baker, 2002), p. 97. Para todo o tratamento de Henry dessas proposições, veja Carl F. H. Henry, _God, Revelation, and Authority_ (Waco, Tex.: Word, 1976-1983), vols. 2-4.
[10] “A Biblical Worldview Has a Radical Effect on a Person’s Life,” Barna Group, December 1, 2003.
[11] Ibid.
[12] Veja Peter Berger, “The Perspective of Sociology: Relativizing the Relativizers,” em _A Rumor of Angels: Modern Society and the Rediscovery of the Supernatural_ (Garden City, N.Y.: Anchor Books, 1970).
[13] Stanley Grenz and John Franke, _Beyond Foundationalism_ (Grand Rapids: Eerdmans, 2000), p. 53.
[14] Ibid.
[15] Esta afirmação é ilógica. Se a linguagem não pode agora representar o mundo objetivo, por que pensar que a linguagem pode representar um mundo futuro? Se a linguagem é socialmente construída em essência, ela permanece uma construção em referência a reivindicações futuras tanto quanto a reivindicações presentes. Além disso, os autores querem que acreditemos que suas declarações sobre a realidade escatológica são verdadeiras agora. Se assim for, essas palavras devem ser mais do que meras construções sociais. Se assim for, segue-se também que nós não – como eles afirmam – habitamos um “mundo linguístico de nossa própria criação”, mas que temos alguma reivindicação cognitiva sobre o “mundo em si”. Assim, a perspectiva deles parece autocontraditória: eles pressupõem uma visão da verdade que negam explicitamente. Sua perspectiva ecoa temas de Jürgen Moltmann e Wolfhart Pannenberg. Para uma crítica da escatologia e visão de mundo geral de Pannenberg e Moltmann, veja Carl F. H. Henry, “Shall We Surrender the Supernatural?” em _God, Revelation, and Authority,_ 6 vols. (Waco, Tex.: Word, 1976-1983), vol. 6.
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